domingo, 23 de novembro de 2008

Para um Amor-perfeito sentido

por Keissy Carvelli

Olha, eu não vim aqui plagiar nenhum conto metido a bonito e famoso. Não quero parecer hostil. Caio Fernando muito me agrada, e se posso, neste segundo, bater os dedos freneticamente nesta ordem de frases, sons, e intenções, é por ele. Não. É por você.
Eu não quero te dizer adeus, eu não preciso, nós não precisamos. Amor só não basta, todo o mundo sabe. Você me disse, e talvez até eu mesma tenha me dito. Você me basta, e isto deve bastar. Eu devo bastar à você.
Eu quero te levar num Natal comum, te mostrar o meu jardim e as minhas histórias. Te levar por aí em noites de calor; tirar o teu sapato para sentir o asfalto tocando teus pés; te fazer correr como uma criança atrás de uma bola; te mostrar o céu inteiro de estrelas e lua de Ano Novo, o céu mais bonito que eu já pude sentir.
Há tantos pensamentos, tantos sentimentos perdidos aqui dentro. Há tantas vozes sussurrando versos aqui dentro, e agora eu posso ouvir. Eu posso ouvir toda a falta de inspiração, todo o cansaço, todo o silêncio.
Eu quero te levar num Natal. Estava o tempo todo procurando a sinestesia mais próxima, a comparação mais real, a aliteração perfeita. Metáfora. Eu quero te levar num Natal.
Eu tenho procurado você em todos os detalhes da minha cama, em todos os meus discos, cigarros, e livros. Eu tenho te procurado em letras de blues, em acordes dissonantes de MPB, em choros de samba, em timbres de vozes doces.
Eu tenho procurado uma maneira platônica para não deixar cair uma lágrima; eu tenho disfarçado os meus sentidos com o meu sono; eu tenho escondido o meu medo nos meus dias.
Há tantas lembranças nos meus braços, no meu rosto, na minha pele roubando a minha atenção. Há tanto sentido em não ver sentido algum para te dizer adeus.
Olha, eu vim aqui te escrever sobre os meus olhos, e minha respiração, minha saudade. Reinventar, aludir, plagiar, que seja! Eu quero te levar para ver o céu mais bonito que eu já senti, um céu de estrelas e qualquer lua que seja. Olha, eu vim aqui. Eu quero te levar para um Natal.

sábado, 22 de novembro de 2008

Não completamente

Por Keissy Carvelli

Os olhos se fecham
Por onde andarei sem teu sorriso?
Pode ser a última vez
De abraços inteiros,
Olhos de canto
E amores incontidos.

Meus olhos se fecham.
Por onde andarei sem tua presença?
Pode ser a última vez
De céu aberto,
Canções escritas
E versos sentidos.

Teus olhos se fecham.
Por onde andará sem meu abrigo?
Pode ser a última vez
De sonhos vividos,
Presentes escondidos
E beijos proibidos.

Meus olhos se fecham.
Não andarei sem tuas mãos comigo.
Pode ser a última vez
De sexo florescido,
Conversas discutidas
E perfumes confundidos.

Meus olhos se fecham.
Não pode ser a última vez.
Amor não se afasta com a distância, menina.
Amor eu guardo por dentro,
Esqueço defeito,
Desfaço receio.

Nossos olhos se fecham.
Não é a última vez.


p.s: Cansei dos meus clichês. Não há verso que traduza o sentido daqueles dias...sinto, muito.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Être

Não quero criar personagens. Eu quase não acreditei quando me disseram que eles tomam vida própria. Quase.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Saudade sóbr(i)a

por Keissy Carvelli

Minha saudade não sorri sozinha. O teu perfume também invade minha casa, meu quarto, minha cama. Teu perfume invade os meus sonhos de noites e dias inteiros sem me dizer, sequer, uma única palavra.

O teu perfume não me invade sozinho. Há vestígios materiais de você. As tuas linhas, as tuas manias, teus vícios, tuas fotos, teus presentes caem bem na minha estante, na minha saudade, no meu instante.

A tua solidez não me completa sozinha. O seu beijo, as suas mãos, o seu corpo sobre o meu, o seu olhar sob o meu, os seus sorrisos dentro dos meus transformam minha casa, meus livros, minha TV desligada, em motivos para só pensar em você.

O seu carinho não me deixa sozinha. A minha saudade invade a minha casa, o meu quarto, o meu sorriso, o teu perfume. A minha saudade invade todos os próximos dias, os próximos instantes, o próximo sono.

Nossa saudade não se faz sozinha. São pedrinhas dos nossos dias cheios de versos, músicas e paixões. São pedrinhas justapostas em ordem cronológica, em desordem lógica.

Nossa saudade não se faz sozinha. A minha completa a sua com essas quase rimas, com o som que faz quando um de nós se vai. A sua completa a minha com o blues biografado, com o pequeno pedaço do que era seu e agora é meu e tem nome. A nossa saudade vai se completando assim, como as linhas escritas num mesmo espaço, num mesmo foco, num mesmo sentido.

A nossa saudade nunca é completa quando falta a tua voz suspirando os nossos dias bem perto de mim. A minha saudade sente a sua falta, e a sua falta é o que me sobra.


quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Enquanto eu vou

por Keissy Carvelli

Tudo o que eu ouço é a chuva batendo na janela às minhas costas enquanto vou tateando minha saudade com as pontas dos dedos que há pouco estiveram em todo teu corpo.
Se estivesse aqui, talvez saíssemos nessa chuva de mãos dadas andando por aí, numa praça deserta, ou por entre as ruas alagadas de carros e histórias. A nossa estaria sendo feita a cada centímetro de sorriso despedaçado e completado com nossas besteiras e nossos cafés. Só tomo café do seu jeito, com o nosso cigarro, com você.
Minhas promessas se confundem com o meu desejo de te segurar bem forte e não te deixar ir, mesmo que seja eu quem tenha que ir. A chuva não deixa, ela me quer aqui. Ela pede um beijo, sob suas gotas frias, sob seu céu cinza. Ela...
O som da água batendo no chão não tem graça, o som de bolero, de blues, de samba não tem graça. A saudade não tem graça. Eu sem você parece não ter graça.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Tuesday morning

por Keissy Carvelli

Eu devo dizer que gostar me machuca. Não sei se pela intensidade ou se pelas impossibilidades. O excesso dói, seja lá do que for.
Mas eu tenho um amor, desses que ri quando falo, que beija quando eu calo. O meu amor é desses que compra cigarro, café e sorrisos, coloca tudo numa caixinha e me entrega escondido. O meu amor não chora a despedida.
Eu não escolhi, não se pode apontar o dedo e dizer "vai ser meu amor", perde o encanto, a curiosdade. Não houve escolha, quando abrimos os olhos a bebida já não existia entre uma boca e a outra.
O meu amor sai cedo, roda o dia, completa o meu dia. Troca de lado, suspira alto, fecha a porta, dorme em mim. Sorri sem os olhos, sorri pelo canto, pelo meio, sorri em mim.
Não se faz amor com prosa, verso, poema, canção. Não se faz amor escondido sem paixão. Não se faz qualquer besteira escrita pela manhã sem saudade, vontade, princípio de exaustão.
Não se faz dia assim sem teu beijo, seu aceno, teu abraço.Não se faz saudade sem você.
Eu tenho um desses amores na pele, nos olhos, nas letras e melodias.

domingo, 21 de setembro de 2008

Ainda que

por Keissy Carvelli

Eu gosto quando ri espontâneo sobre qualquer bobagem que eu diga em tom sério. Eu gosto quando me surpreende com um beijo, e quando me invade com um olhar, dizendo bem lá no fundo, lá dentro de mim, aquilo que tua voz tampouco pode sussurrar.

Eu gosto quando perde a graça e abre só um pouquinho a boca expressando a sua indignação com as minhas palavras. Eu gosto do sorriso que se forma quando isso acontece.

Eu gosto quando existe apenas um ou dois travesseiros me distanciando de você, e quando recebo uma mensagem enquanto escrevo.

Eu gosto das nossas brigas, e da irritação que você me provoca. Gosto porque é o que te difere.

Eu gosto do teu perfume e do quanto me sinto segura com ele. Gosto do meu perfume encontrando o seu.

Eu gosto daquilo que não gosto, de tudo o que não suporto. Gosto porque é quando eu percebo que, ainda assim, eu sou estupidamente louca por você.

Eu gosto quando tenta não me perder, ainda que não tente me ganhar. Gosto porque é o que me faz voltar.

Eu gosto quando não há argumentos, nem explicações. Gosto quando não há desdém nem glorificação.

Eu gosto quando ri espontâneo sobre qualquer bobagem que eu diga em tom sério. Eu gosto porque é quando não há, sequer, um travesseiro entre o seu sorriso e o meu.


segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Meus discos

por Keissy Carvelli

Às vezes eu me pergunto o que há entre mim e você que faz dar certo. Se é o teu sorriso de criança que combina com o meu meio de canto. Se são os teus discos estranhos que se encontram com as minhas velharias musicais; se são os teus livros empoeirados que procuram os meus virtuais.

Tem horas que procuro saber o que faz a gente se gostar assim. Se é a sua forma de me irritar com os teus princípios se chocando com a minha mania de classificar ações. Se é o teu não-ciúme brigando com o meu ciúme escancarado. Se são as tuas palavras doces seguidas de risadas observando as minhas palavras rudes e doces seguidas de pontos.

Às vezes eu me pergunto o que faz eu te querer tanto. Se é o teu beijo calmo que vai levando o meu. Se é o teu olhar perdido em contrapartida com o meu, te fixando nos olhos. Se é a tua mão pequena agarrando na minha um pouco maior, de unhas vermelhas. Se é o teu perfume que gruda na minha roupa cansada do meu cheiro. Se é a tua saudade desfreada e carente gritando com a minha, controlada e coesa.

Às vezes eu me pergunto se é o teu cabelo claro misturado ao meu escuro; se é o teu olho escuro misturado ao meu claro; se é a tua inteligência alta brincando com a minha mediana. Se é o teu egocentrismo rindo da minha auto-destruição.

Tem dias inteiros que me pergunto por que você gosta de mim. Se é pelas minhas poesias exageradas derramadas sobre a tua contenção. Se é a minha mania de fazer tudo o que quer contribuindo para o teu "não me pressione". Se é a minha paixão em música, prosa e rima aceitando o tua em frase.

Ás vezes, em horas, em dias, em instantes, eu me pergunto o que há entre nós. Se é a sua brincadeira de verdade testando a minha verdade de brincadeira. Se é a sua relação às avessas conquistando o meu avesso.

Às vezes eu me pergunto por que é que eu me pergunto. Se é pelos meus motivos conflitando com as suas razões.

Às vezes eu me pergunto o porquê de tanta pergunta. Se é pela minha intromissão disfarçando a tua estranha convicção, ou se é pela minha distração de não perceber que em você eu encontro meus livros, meus discos e descanso minhas folias e meus risos.






[...e ainda diz que não é nada minha.]

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Passagem

por Keissy Carvelli

A distância chegou sorrateiramente, sem que eu esperasse, tampouco precisasse. Eu nunca saberia explicar o quanto eu não a suporto.

O caminho entre o meu quarto pequeno e mal iluminado até a cozinha me enche de náuseas. Preciso me certificar de dar os passos certos para não distorcer a direção. É insuportável. Percorro quilômetros sem saber quando será a próxima vez, sem saber, sequer, se haverá próxima vez. Tudo se apresenta tão instável, tão longe, tão distante.

Insuportável a distância entre o desejo e a pele; entre os olhos e o toque; entre a vontade e o beijo. As cores vão perdendo o tom a cada segundo que passa e não há nada a ser feito. Eu não esperava por ela, por elas. Soa como um contragolpe, e eu já não posso defender meus receios, meus medos.

Estão todos jogados por aí, uns por aqui, e pouco importa. Não há receio quando há um sorriso que venha daquele rosto conhecido e pouco visto. Eu não suporto a distância física cravada em estradas curvas. Eu não suporto a distância que provoca a saudade, a incerteza, a certeza de que uma hora ou outra eu apareço. Eu apareço por lá, por aí, eu apareço em ti.

Eu não sei quem é você, quem é ela, e por que raios tudo se confunde. Eu não sei por que raios eu vou dizendo tanta besteira, tendo uma imensa vontade de apagar cada letra mal digerida, mal decifrada. Eu não suporto a distância que me coloca tão perto e tão longe de você. Eu não suporto a distância, eu me importo com você.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Citação

por Keissy Carvelli

Eu estou aceitando qualquer coisa.

Aceito o teu perdão, teu senão, teus erros, teus conflitos e medos. Aceito tua saudade, tua carência, teus meninos, teus desatinos, teus beijos, e tua distância.
Vou aceitando os teus sorrisos, tuas mãos, teus cabelos, teu corpo inteiro. Vou aceitando o teu egoísmo, teu altruísmo, teus amores, teus amigos, teus sabores e teus delírios.
Aceito o teu choro, as tuas frases, teus diálogos, teus ciúmes, teus passos e descompassos. Aceito tuas pausas, teus critérios, teus segredos, teus passeios, teus gostos e desgostos.
Aceito teu atraso, teus cigarros, teu abraço, teu silêncio, tuas euforias, tuas piadas, tuas magias. Aceito o teu sotaque, tuas músicas, teu sobrenome, tua cultura. Aceito teus desejos, tuas manias, tuas maneiras.
Eu aceito teus pedidos, teus recuos, tuas hipérboles e transgressões. Eu aceito os seus avessos, seus contextos, e suas paixões. Eu aceito porque não aceitar é poesia sem rimar.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Um trocadinho, tio.

Eu poderia estar matando, roubando, ou vendendo o meu corpinho, mas não. Eu estou aqui, pedindo e vou dar motivos bem relevantes para tal.
A situação é a seguinte: vivo numa crise financeira fodida, e sim, eu saio, eu bebo, eu me divirto, mas sempre sem um puto no bolso. De onde arranjo grana pra beber e festar? Quem não tem dinheiro tem amigos, right? Pois bem, e eu amo os meus!
Ponto dois: estudo jornalismo numa faculdade que não era bem a que eu queria, é estadual, okay, numa cidade até bacana, mas juro, os professores são do tipo que não empolgam ninguém. Nada daquela coisa inteligente, de instigar o pensamento e enfim. Aí já começa tudo.
Ponto três: aqui, apesar de ser uma cidade maior que a minha e bem longe, não há nada do que eu sempre quis pra mim. Shows? sertanejo. Cursos oferecidos pela faculdade? agronegócios, como se tornar um ótimo pequeno agricultor e afins. Livros?UM ÚNICO SEBO. Pessoas? se alguém daqui conhecer Bukowiski eu dou o meu bukowiski pra qualquer um.
Ponto quatro (eu sei que já tá chato, mas continue, por favor): prestei a prova de transferência pra UFPR (a faculdade e a cidade que eu realmente quero), mas não passei, óbvio. Estou no meio do primeiro ano e caiu coisas do segundo ano. E, além disso, sou uma fodida, esqueceu? Nessa de ir prestar e tudo mais minha mãe gastou até o que não tinha.
Ponto cinco (e é aqui que a porca torce o rabo): tá rolando as inscrições para o vestibular da UFPR, e encerram em setembro. E eu quero tentar, sabe? Tudo bem que já esqueci muita coisa do cursinho, mas poxa, não custa tentar.A segunda fase é só redação, e dei uma melhorada esse ano. Poxaa...qual é, sabe?! Sem o peso de TER QUE PASSAR eu posso conseguir, nunca se sabe. (tá, tá, uma fodida assim sem sorte não vai passar, mas pôôô, se eu não tentar vou ficar me odiando o resto do ano que vem inteiro e vocês vão ter que me aguentar por aqui falando as mesmas ladainhas de sempre.)
O ponto alto agora: preciso de 85 reais pelo menos pra inscrição. A viagem até curitiba eu dou um jeito, carona, junto as moedas, enfim, mas PRECISO fazer a inscrição e eu não tenho UM PUTO. Alias, tenho uns 2 reais que eu preciso pagar um xerox na MERDA da faculdade.

Eu não sou vagabunda, eu juro que to procurando emprego, mas a MERDA da faculdade é de manhã e por aqui ninguém quer alguém pra trabalhar meio período. Alias, isso já foi o tema de um post meu. Tô tentando um outro emprego numa loja, mas até eu começar a trabalhar (se der certo, claro) e até eu receber vai uns 2 meses. Até lá, meu bem, Napoleão já perdeu a guerra.
Você não doa pro Criança esperança? Pois é, e você nem sabe pra onde a grana vai. Pois bem, ajude uma única pessoa que só quer tentar entrar numa faculdade melhor, para se tornar uma pessoa (jornalista) melhor e poder conhecer pessoas inteligentes, e viver numa cidade onde há cultura e livros a 3 reais.
É bem fácil, qualquer cinco reais ajuda. Qualquer coisinha. Só não vale passe de ônibus. Sério, gente. Sei que tem até um número grande de pessoas que lê todas as minhas besteiras por aqui, então vai, ajudem uma aspirante a qualquer coisa a tentar conseguir algo melhor.

Ok, chega de drama porque isso não é o programa do Gugu.

Banco Itau
CONTA POUPANÇA

Ag: 0446
Conta Poupança: 21008-0/500


quando eu for rica e famosa juro que recompenso quem ajudar =D

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Anominal

por Keissy Carvelli

Ah, Chico. Eu mal conheço teus versos, mas gosto e para gostar não é preciso conhecer muito. Basta olhar, ouvir um sorriso, sentir um abrigo.
Não faço cinema, Chico. Não faço nada de excepcional, e já não tenho muita vontade de ser a tal. Andei pensando e talvez eu nem acredite mais em Deus. "Desvairada", pensa você. Quem sabe eu seja isso mesmo e mais um pouco. Talvez eu seja bem menos, e talvez eu saiba que não sou nada daquilo.
Eu sou um desastre, Chico. Um desastre lúdico, confesso, com um resquício poético desses Pessoas que leio. Ainda assim um desastre.
Quando eu era criança, e brincava de pés descalços, e corria pela rua asfaltada e cheia de pedrinhas eu sofria de insônia, sofria mais, sonhava mais. Eu suava pelas tardes ensolaradas e nem a lua me impedia de manter os olhos abertos e correr por todos os cantos da minha imaginação.
Agora, Chico, eu durmo a qualquer hora e insônia eu desfaço com um cigarro. Nem insônia eu tenho mais, disse para dar uma idéia temporal de mudança. Eu nem sonho mais.
Quando a gente cresce, Poeta dos Acordes, a vida se acostuma. No primeiro soco a gente chora, sangra, reza, escreve, faz o diabo. No primeiro tombo a gente sofre, descabela, desfalece, perde os ponteiros, mas não entrega os pontos.
Na segunda luta a gente acorda mais cedo, ora, faz mandinga, promessa; trança os dedos, traça os olhos, estuda os trajetos, porém quando o mesmo soco vem de encontro à nossa sorte a gente cai. Depois levanta.
O brilho volta em uma semana. O soco volta em um mês. O terceiro, o quarto, o quinto dos infernos. Aí já não sangra, não chora, não bate. E quando a dor se acostuma com o peito, Chico, ela deixa de doer.
Francisco é seu nome, Chico? O meu pouco importa. Eu não o leio por aí. E aquilo que a gente não lê a memória não grava. Eu já me esqueci de mim, e meu nome tem tantas letras estranhas que eu prefiro não me chamar.
Posso ser Maria e João, e posso não ser. Já não importa, Chico. Eu já não sonho, e quando eu era criança eu dizia com a voz baixinha: "eu só vou morrer quando eu deixar de sonhar". Sempre achei inaceitável não sonhar. E por isso eu sonhava a todo instante, e minha mãe deixava, mas ela mesma não o fazia.
Agora eu entendo tudo. A gente cresce e começa a entender o que "criança não entende". Eu entendo que sorte é feito o nome: se nasceu Joana muito dificilmente se tornará Maria.
Ai, Chico. Se eu fizesse cinema, e não fosse de ninguém...Sabe Deus o que eu seria. Justo eu que nem sei mais de Deus.
Até mais, Chico. Eu vou dormir, porque para sonhar não basta fechar os olhos.



[ouvir: Ela faz cinema, Chico Buarque, talvez as frases se explicitem mais.]

domingo, 10 de agosto de 2008

Okilled

por Keissy Carvelli

Eu já assumi que sou uma fodida e abusei de argumentos pseudo-sensacionalistas e irônicos para provar tal façanha. Hoje, senhoras e senhores, eu volto para dizer que, além de fodida, eu sou também uma estúpida.
Que eu nunca me dei muito bem nessas coisas de amor-relacionamento-namoro-paixão não é novidade. Eu sempre deixei escapar toda essa falta de sorte, ou de sei-lá-o-que em cada palavra usada, em cada frase, gesto, rima, verso e, sinceramente, nunca liguei em deixar explícito o que eu procuro metaforizar. Mas eu, sinceramente, não sei que raios está acontecendo.
Eu poderia culpar todas as merdas que eu já vivi nessa coisa sentimental; poderia culpar a falta de sorte, a falta, ao longo do tempo, de pessoas que se importassem de fato. Eu poderia e eu vou, ainda que isso não resolva nada. E não mesmo.
Eu faço coisas por fazer, e você pode trocar "faço coisas" por "beijar pessoas" que não mudaria o sentido da frase. Eu saio por aí e vou me perdendo dentro de mim, e dentro dessa falta; e vou me enfeitando com lápis, esmalte, batom; e vou me embriagando de cerveja, cigarro, música e não chego a lugar algum. Eu vou machucando antes que eu me machuque, e eu nunca fui de machucar ninguém. Eu prefiro me machucar, ou prefiria, eu já não sei mais.
Eu não me importo mais com uma porção de pudores porque nunca ninguém se importou comigo. Eu não me importo de viver assim, num vazio assustador, eu me acostumei a isso. Eu me acostumei a ir levando todas essas coisas erradas, e sem consistência, porque quando eu quis ninguém me quis. E quando eu estava lá, eu estava sozinha. Eu ainda estou sozinha.
Eu me tornei uma estúpida e ninguém me impediu. Antes eu vivia bem com as minhas paixões platônicas, minhas idéias lúdicas, meus amores extravagantes. Mas o tempo passa, senhoras, e senhores. O tempo passa, e muita gente passa deixando marcas, e lágrimas que secam, e a gente vai ficando assim. Eu fiquei assim.
Pro inferno as paixões platônicas, os devaneios! Eu satisfaço meu ego com milhares de porcarias que eu faço por aí. Eu satisfaço meu ego, minha insegurança, meu egoísmo, meu despudor com qualquer olhar que se aproxime. Eu vou fazendo, e sei bem quando faço. Eu assumo! E espero que assumir me faça menos estúpida. Menos hipócrita já me alivia, de qualquer forma.
Ela tem um bom motivo para fazer tudo. É o carinho quase que apaixonado, é a amizade, a carência+amizade, o vinho, o passado, o diabo a quatro. Ela tem mil motivos, e motivos são sempre motivos singulares e unilaterais. Eu não. Eu não tenho motivo algum para fazer as coisas que faço, mas não há nenhum para não fazer. Ela faz, será que vocês entendem?! Ela também faz. E a gente vai se machucando, e explicando, e voltando ao mesmo ponto sempre, porém com mais intensidade. E eu não consigo parar. Ela não consegue parar.
Eu sou uma estúpida porque eu estraguei, com uma noite, três ou quatro dias perfeitos. Eu estraguei porque ela se importa, e eu gosto disso. Eu estraguei porque eu não queria me sentir idiota, e, diferentemente, é tudo o que eu consigo me sentir agora.
Eu estraguei porque eu sou uma estúpida que precisa aproveitar todas as chances que me aparecem como se o mundo fosse desabar amanhã. E, pasmem, o mundo não acabou. Eu não dormi, não comi porra nenhuma e já passam das quatro da tarde, e nenhum tremor sinalizando o fim dos tempos.
Eu sou estúpida e não me importo em dizer. Eu não me importo com muita coisa, mas eu me importo com ela, e acho que ela não sabe. Eu me importo com o tamanho do sorriso dela e por isso uso as gírias que ela gosta na hora certa. Eu me importo com o que ela vai sentir ao perceber minhas mãos em seu rosto; eu me importo com os medos que ela guarda e controlo todas as minhas vontades.
Eu me importo com o que ela vai pensar de mim se eu tropeçar e cair; eu me importo com as escolhas que ela faz, e queria fazer parte de todas. Eu me importo com os sonhos que ela tem, e procuro suavizar suas quedas. Eu me importo tanto que pareço criança com caderno e caneta na mão dizendo bobagens em voz alta para qualquer um ouvir.

Desculpem a estupidez da expressão, mas eu sou uma estúpida.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Subterfúgio Nostálgico

por Keissy Carvelli

Fechei meus olhos por breves instantes numa nostalgia barata, quase que pueril.

Os dias eram de sol ao centro, tão cheios de vida quanto a minha vontade de tocar-lhe os lábios com as pontas dos meus dedos e envolver aquela paixão nos meus braços imprudentes e extremistas.
Arrisquei todos os meus pudores sem qualquer questionamento; enfiei numa mochila algumas roupas novas, o meu sorriso, a minha saudade e, na carteira, alguns restos de tostões. Menti severamente como quem mente aos três anos de idade sobre um chiclete escondido, um chocolate comido. Afastei os temores com as lembranças dos olhos de menina; apanhei com os pulsos firmes aquela passagem amassada e quase rasgada do suor trêmulo e coloquei-me naquele ônibus, beirando o vulgar, que me levaria ao lugar onde eu nunca soube se pertenci.
Joguei os olhos pela janela e, pela sua transparência, encarei a escuridão. Algumas estrelas brincavam de se esconder entre as nuvens; a lua, por vezes, contrariava o tempo e não passava, não deixava os minutos correrem depressa. Minha saudade gritava, imaginava um passado recente, projetava um futuro ausente.
A estrada encolhia solitariamente, tão solitária quanto eu e meus devaneios pulando naquela poltrona fria. Os minutos soavam feito pedras grandes e dolorosas rolando em linha reta. Era capaz de ouvir meu silêncio ensurdecedor lutando contra os ponteiros do relógio.

Nas costas uma mochila velha; nas mãos toda uma saudade de meses, e medos, e desejos. Um abraço distante seguido por um beijo tátil concretizou todas as minhas incertezas. O incerto sempre gostou de brincar comigo, e eu ia deixando, deixando, até perder completamente o jogo.
Os olhos eu conhecia. Aquela feição contida, aquele meio sorriso se abrindo a cada beijo. As mãos seguravam os fios dos meus cabelos e logo percorriam todo o meu rosto, meu corpo, meus sentidos e sensações. Eu conhecia cada extremidade daquelas confusões, e me envolvia em todas elas com tudo o que havia de bom em mim.
Derrubamos lágrimas que já não sabiam exatamente para onde correr; derramamos pelos dedos todos os sonhos unilaterais, os princípios desiguais. Era o suor das noites quentes e ofegantes contrastado com a distância dos dias claros. Era o sexo contra o amor, o meu amor. Era o que eu sentia contra mim, somente contra tudo o que eu, solitariamente, era.
Sol, e lua, e madrugadas, e risos, e lágrimas. Muitas lágrimas sem entendimento, sem sentimento. Agarrou-me pelas pernas, pelos braços e coração como quem agarra um brinquedo e não quer mais soltar. Eu precisava me soltar de qualquer maneira, ainda que o meu choro brotasse feito dor.
Não deixei escapar o quanto me doía arriscar perder aquele beijo, aqueles toques e aquele mistério exalado pelos olhos baixos. Afagada pelo abraço, sussurrei que não voltaria mais. Subi o tom de voz sem titubear e sustentei a idéia de não mais voltar. Eu não voltaria enquanto a nossa vontade não fosse só minha. Enquanto a minha saudade, o meu amor não fosse só meu.
Dos olhos algumas lágrimas como resposta. Eu tinha razão e não havia questionamentos. Acalmei seus erros e deixei o silêncio invadir o quarto e, depois, o sono se sobressair ao silêncio.
Mais um sol surgindo e, antes que eu pudesse refletir sobre minha própria decisão, abordou-me de forma sutil, de forma única como nunca fizera antes. Calou-me com os olhos prometendo não me deixar ir sem previsão de volta. O sol não dava qualquer toque hollywoodiano para a cena, porém tudo parecia fazer sentido.
Por um único instante pensei que ali, naquele exato momento, fazíamos todo o sentido. Não dei-lhe uma resposta direta a não ser um beijo. Um longo beijo e um abraço. Senti o perfume e os cabelos longos caindo sobre os meus.
Não me prometeu amor. Amor não se promete. Não prendeu minhas paixões em sua casa, sua roupa, seu colar. Disse apenas que não deixaria. Não me deixaria ir assim, dizendo que não mais iria voltar. Ela não sabia que para deixar é preciso, antes, ter. Ela não sabia que para um deixar, é preciso ter o outro. E eu, eu nunca tive, sequer, uma metade dela.
Joguei a velha mochila nas costas e o amor eu enfiei num lugar onde não machucasse tanto. Sorri. Sorri inteiro para completar o meio sorriso dela. Antes de partir um “eu te amo” surgiu como palavras de um fim, talvez, um quase meio, o desejo de um início.
A voz rouca, embargada, confirmou mais uma vez num tom de dúvida: “você vai, mas eu farei você voltar.”

Um ano passou sob a pele, nenhuma passagem em minhas mãos, nenhum pedido de retorno. Eu nunca mais voltei.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

259 KM

por Keissy Carvelli

Eu queria ficar aqui e não preciso usar metáforas para dizer. Eu queria teu perfume, teu sorriso e tua pele a cada abrir de olhos dessas manhãs com vento e céu limpo.
Eu queria teu beijo nas noites de sono, nas estrelas brilhando, nas luzes piscando, no som ecoando por toda a pista. Queria tua mão na minha nos carros passando, na rua vazia ou imersa em multidão.
No calor dos dias, no frio da saudade eu queria ter teus olhos olhando os meus e não encarando uma janela estúpida de despedida.
Eu queria tanta coisa que nem posso, mas queria você mais perto. Bem perto dos meus braços, da minha boca, do meu toque, da minha paixão. Queria mesmo acordar o teu riso com o meu; transcrever o meu amor no teu; convencer que o meu adeus não é meu.
Eu queria, queria tanto que soa pueril. Eu queria tuas brincadeiras, e até o teu jeito infantil. Queria não ser o pretérito perfeito, e ser a sua perfeição.
Eu quero, menina, todos os teus sentidos, seus conflitos, suas feições. Eu quero não ter que ir, não ter distância, e ter você pra mim.
Eu quero não olhar pela janela estúpida do ônibus e me ver partir.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Fucking girl

por Keissy Carvelli

Eu sou uma fodida. F-O-D-I-D-A. E não me venha dizer que não, que “ó, você tem tudo”, “você é tão dedicada, você é isso, é aquilo, e daqui um tempo...”. Pro inferno com o seu tempo, o seu futuro e as suas palavras bonitas. Eu sou uma fodida, e assim sempre vai ser,ponto.

Minha atual situação financeira é a seguinte: tenho 2 reais e 30 centavos no bolso, 5 reais na conta, cartão de crédito SEM crédito (não, eu não sou uma compulsiva que gasta todo o cartão), meia garrafa de leite na geladeira, e um pacote de macarrão. Não, eu não tenho um puto de um molho de tomate, apenas o macarrão.

Além do mais eu tenho uma festa sábado pra ir; acabei de perder o furo do meu piercing no nariz pelo simples fato de que vou pra casa no domingo e não seria nada agradável, diante da situação atual, chegar com uma argola pendurada numa narina. E não, eu não tenho miseráveis reais pra comprar um piercing pequeno.

Claro, eu tenho um computador, um ap bacana (com companheiras de ap não tão bacanas assim), internet, câmera digital, mp4 e bons amigos. Mas isso não faz de mim uma pessoa menos fodida.

A minha situação familiar não é nada reconfortante, e eu prefiro não falar disso. E a falta de dinheiro é grande. Claro, se eu ligar pro meu pai dizendo que acabou minha comida e meu dinheiro ele vai me mandar uns 10 reais pra eu me entupir de steak de frango, mas eu sei que por lá a situação está tão fodida quanto aqui, e eu prefiro evitar a fadiga.

Procuro um emprego, e se tiverem algum me avise. O mais irônico é que, há 3 horas, eu tinha um emprego. Vou explicar: fui a uma entrevista para um BOM emprego, e quando digo BOM, em caixa alta, significa UM ÓTIMO SALÁRIO para qualquer pessoa, ainda mais para uma estudante fodida feito eu. Pois bem, eu não tenho experiência alguma e disse na entrevista, óbvio. Ser fodida não faz de mim uma mentirosa, ainda que eu seja em certos momentos. Pois bem, resumindo: ainda assim fui contratada para o BOM emprego. Sorrisos, abraços e resolvi perguntar o horário de trabalho. Adivinhe?! Claro, horário comercial, oras. E pasmem: EU FAÇO FACULDADE DE MANHÃ. Uhul!

Não, não tem como transferir. Essa porra dessa faculdade acha que o melhor para um jornalista que vai ser fodido na vida é ter aulas de manhã, e não tem escolha. É de manhã, sem choro nem vela.

Por 3 minutos eu já me imaginei comprando muitos livros, todos os que eu já li e que pretendo ler; projetei-me comendo pizza aos finais de semana; cerveja nos domingos sem me preocupar com o almoço do dia seguinte; lanches a tarde; viagens; baladas; e já me via rindo da minha estúpida ação de todo dia ao contar moedas pra comprar um estúpido steak de frango.

No minuto seguinte eu já andava pelas ruas com o vento na cara, sem um puto de um cigarro, nem um puto de um tostão para uma cerveja com os amigos no começo das férias. Num instante eu estava sendo contratada para um BOM emprego, estava me dirigindo à um BOM futuro, e a uma BOA conta. No outro...

E aí, definitivamente, convenci-me de que sou uma FODIDA. E quer saber, eu nem ligo.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Só por esta noite

por Keissy Carvelli

Começo só
Um verso triste
De amor e solidão
Sem lágrimas,
Mas que o peito
Sabe que existe.

Começo só
A idéia de um refrão
Quando a madrugada chega
Sutil e derradeira
E já se faz inteira
Junto dela, imperfeita perfeição.

Começo só
Em teus braços distantes
E tuas nuvens tão brancas
Que me jogam pro céu
Feito menina-mulher
De olhos claros,
Desatados, e brilhantes.

Fecho os olhos só
Em pensamento os teus traços,
Em saudade teus encantos,
Tuas gírias, teus desmanchos.

Adormeço só
Para te sonhar mais perto,
Sorrir teu riso incerto,
Provar teu beijo concreto
Que minha boca sente
A cada lua, ou sem luar.

Começo só
O último suspiro de paixão,
O primeiro instante de oração
Para que corram os dias
Mais de pressa que a minha saudade
Pode chegar.

Começo só
Para te fazer tão minha
Antes que o sol me jogue ao chão.
Começo só
Para te falar do amor
Que escorre dos meus tão teus lábios mudos,
Antes que a mágica cesse
E se finde a escuridão.

terça-feira, 3 de junho de 2008

A terceira palavra

por Keissy Carvelli

Eu queria conseguir te falar um punhado de palavras novas, de expressões criativas; eu queria te fazer um milhão de poesias sem soar repetitivas, sem parecer mais do mesmo. Eu já te disse grosserias, já te chamei de amor, já te beijei com os lábios e com os olhos, já te abracei com o meu amor, já te quis mais perto, já te mandei pra longe. Eu já deixei de dizer, fui indiferente, senti indiferente; já não te quis, já te quis de novo, já esqueci do teu carinho, já lembrei do teu beijo. Já odiei tuas atitudes, já amei tua risada, tuas birras, nossas brigas.

Já disse "eu te amo", "sou apaixonada por você"; já fui a dois extremos, já fui louca por você, já senti mais do que eu devia, mais do que eu podia. Já me perguntei o porquê de tudo, já nem quis saber a explicação de tudo. Já fui tudo o que eu podia, já deixei de ser o que você queria.

Algo nisso tudo passou, outros pontos não chegaram ao fim. Você não chegou ao fim pra mim. Quando eu pensei ser ponto final foi apenas um ponto e vírgula, desses que a gente coloca para tomar um ar, dar entonação, e depois seguir no mesmo pensamento, no mesmo sentimento.

Não quero mais pensar, se não for em você. Eu prefiro sentir assim, um segundo de cada vez, uma saudade em cada mês. Eu prefiro ter/ser seu amor com o céu sobre as costas e o chão sob os pés.

sábado, 24 de maio de 2008

Cartas postas à mesa

por Keissy Carvelli

Não, não e não. Mais uma vez não.
São apenas algumas cartas jogadas ao espelho.Não.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Onde as terminações se repetem

por Keissy Carvelli

Quando eu quis ir embora suas mãos me puxaram para trás num toque brusco, impulsivo, sem permitir qualquer reação contrária dos meus braços.

Meus pés pisavam o vão limitante da distância entre o sentir e partir, exatamente assim, em rima pobre com terminação idêntica. Não há rima rica quando as terminações se repetem.

Posicionei meu corpo cansado na fronteira exata das precauções e de todo o sentimentalismo para evitar qualquer tropeço tolo que me levasse ao chão certeiro, sujo e tão bem acostumado a essas caídas grosseiras. Meus dedos tocaram o trinco maciço, suas entranhas chocaram-se contra a madeira provocando um ruído típico de partida desses que duram horas dentro de quem sente, porém a porta não se abriu.

Seus olhos estavam ali, fitando os meus sem perdão nem pecado. Eram olhos concretos, ainda que distantes, pedindo, em protesto às minhas mãos, um abraço; eram olhos chamando os meus para dentro, para mais perto. Eram olhos de quem diz “não, não vá ainda, jogar-se para fora assim não é preciso”. Eu sei o momento de ir.

Estava, em silêncio, retirando aos poucos o pouco que me restava, não era uma precipitação desesperada por um fim, eu não me punha para fora aos socos e pontapés. Dedilhava meus passos para o começo de mim restringindo todos os meus focos à minha percepção. Eu sabia que deveria ir, eu sabia.

Mas era você, eram seus olhos, suas expressões doces dizendo que a minha razão não exercia sentido algum. Eu sentia, e não deixei de sentir. Era tua mão aos prantos puxando meu corpo para a tua direção, e puxando meus sorrisos, meus sonhos, minhas idealizações para você. Como eu, vulnerável aos teus anseios, poderia insistir nessa insana obsessão de racionalidade?

Voltei num caminhar lento e, a cada centímetro andado, era a espera de um beijo; a cada movimento controlado, uma noite em pensamentos ilusórios. Voltei para a sua vontade, para a nossa intensidade sem sequer renunciar às minhas vozes realistas. Eu sabia, eu tinha de ir, mas não fui.

Tomei meu lugar, mas não o dele; acalmei os meus tremores internos; traguei um resto de cigarro; recolhi os restos de mim e fui colando pedaço por pedaço com teus afetos e amores. Fui traçando um novo lugar, uma nova vontade de te sentir; fui traçando, trancando os medos, arriscando as cartas, trançando os dedos até esquecer o trajeto da cama até a porta. Eu deveria ter ido.

Não fui e ouço agora dos mesmos lábios mais um pedido, uma escolha, uma renúncia. Ouço, daquela mesma voz incerta, novos ruídos simulando, em contornos discretos, o exato caminho de nós até o “eles”.

Diz, sem fitar meus olhos, que não há partida, porém naquele quarto o “eu” já é demais; os nós desataram; a febre envolve aqueles outros dois, eles dois, não eu. Não há mãos nos meus ombros, nem braços, abraços mistificando o caminho.

Eu deveria ter ido ao meu pedido, mas sempre atendo ao seu. Agora eu vou.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Íntimo maltrapilho

por Keissy Carvelli

É o tema quem me incomoda. A falta dele, para exagerar de uma sinceridade programada e hipócrita.

Tudo me parece muito igual para ser dito, quanto mais para ser colocado em palavras rebuscadas e previamente dissolvidas em exaustivos espasmos. Há uma monótona repetição que me aporrinha o saco a cada abrir e fechar dos olhos, sem me permitir um súbito fluxo daquela criatividade efusiva de principiante.

A forma sólida, abstrata; as colocações e preposições; as objeções, focos e nexos surgem feito repetições cíclicas e mal humoradas de uma falta segura e intacta de novas fontes e visões.

Sinto-me presa à necessidade da escrita sem ter em mente qualquer inspiração para as letras. Leio compulsivamente numa tentativa desesperadora de absorver, digerir, ou sei lá mais qual função biológica possa existir.

Há também, entrelaçada a todas essas perturbações inertes, uma falta de paciência para o resto do mundo. Todo ele, quase que sem exceções. Imagino que a falta de extremos me incomoda.

Alternei a parede do quarto com uns recortes e figuras deixando tudo bem criativo, confesso. É essa minha antiga mania adolescente de sempre querer dormir numa aparência estudante-alternativo-de-jornalismo. Grande coisa, mas me agrada. O quarto eu mudo, colo uma coisa aqui, uma capa de cd ali, mas e que raios eu faço com os punhos fechados e pés intactos?

Sou uma eterna insatisfação, talvez. O passo seguinte é sempre esperado como glorificação de um estado maior de satisfação, e então o passo é apenas mais um passo. E, por deus, não há satisfação plena. Qual é? Então eu, uma estúpida indagadora de tudo, vou agora dizer que acredito na felicidade plena? Uma casa na praia, um cachorro, e um amor desses de encher os olhos não seria nada mal, confesso, no entanto seria uma morte lenta e deplorável a cada segundo de tédio.

Começo a acreditar que não sei viver sem uma paixão dessas ridículas que te botam num extremo maldito de escritas hiperbólicas. Sobre o que vou escrever, alguém me diz? O mundo anda a mesma coisa: a Isabella já me encheu o velho saco; o Ronaldo e as travestis já viraram uma bela palhaça, ora essa, qual o problema em querer comer algumas travas numa noite solitária? Agora vão lá as três pseudo-moças dizer que era tudo mentira e que o tal Fenômeno não sabia mesmo que o sexo de aluguel era do mesmo sexo? Ah, por deus. É melhor eu voltar ao meu íntimo maltrapilho.

Uma paixão sempre é motivo para as melhores palavras; o vocabulário se enriquece sem qualquer esforço mental. É sempre paixão, mas não há nada que faça os dedos palpitarem tanto quanto essa estação.

Quem sabe eu não sirva mesmo para escrever outro tipo de coisa. Essa história de inventar algo para contar não me atrai em momento algum, não há como deixar aquela sinceridade programada de lado, ainda que hipócrita.

Por fim, não há fim. Uma bela falta de tema é, numa noite fria e impaciente, um bom motivo para escrever.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Tirinhas

por Keissy Carvelli

Cometer um furto ao Estado é bem legal. Gera um tipo de alívio a alma, uma leveza no ímpeto do ser como se você saboreasse o último pedaço de bolo do aniversário daquela tia-avó velha, chata e sem graça.
Não, eu não desviei milhões, não fiz um "depósito do povo" na minha conta da Suíça e não, definitivamente não paguei a tapioca com o cartão corporativo. Foi apenas um rolo de papel higiênico, um grande, bem grande, eu confesso.




Nota do eu-ditor: Keissy jura que cometeu tal ato por motivos de força maior, e sim, ela assume, em náuseas, uma atual crise criativa. Disse ainda, em off, ser assim, engraçadinha e irônica quando a tal crise ataca. Promete não se apaixonar, e criar posts menos mexicanos. Promete também mentir menos.

Nota 2 do eu-ditor: www.novasvisões.com.br, um novo lugar para onde escapam minhas prosas sentimentais.

Nota 3 do eu-ditor: www.jornaldecera.blogspot.com, coisa de calouro de jornalismo.

terça-feira, 29 de abril de 2008

Em punho e coração

por Keissy Carvelli

Amor, precisava te escrever algo de forma indireta. Piegas, eu sei, nunca neguei minha inclinação para as coisas bregas da vida. Idealizei uma carta, uma canção, uma poesia, mas de que forma vou escrever? O cansaço corrói meus ossos, e meus olhos são tomados por essas lágrimas vadias e miseráveis que jogam na minha cara a intensidade desse sentimento outrora doce, sutil e risonho que eu prefiro chamar de Amor, assim mesmo, em letra maiúscula, como seu nome grafado em segredo por entre essas linhas.
Tentei não me importar, fiz das minhas provocações uma vingança diária dos meus próprios desafetos; fiz dos meus enganos as minhas próprias desculpas; fiz dos meus sorriso os teus próprios versos, e dos teus sorrisos os meus melhores poemas. Fiz até canção que era pra te tocar em sol maior; criei recordações minuciosas da tua boca encostando a minha em tom calmo e preciso, e eu te encostando naquela parede , e te encostando em mim, que era pra ter seu cheiro um pouco mais perto. Era só pra te sentir em mim, e pra te sentir assim fiz dos meus dias as saudades dos nossos, e das minhas letras os sentidos mais intensos. Eu já te imaginava disposta sobre minha cama me ouvindo cantar, e eu, de olhos fechados, dedilhava aqueles clichês musicados, e por um segundo quase me envaidecia dos teus brilhos.
Eu já imaginava tantas cenas e roteiros, e sei, parece bobo, e de fato é, mas minhas ilusões desvairavam sobre seus olhos e sobre a remota possibilidade de tocar suas mãos por inteiro.
Eu não sei o que houve, onde tudo se perdeu, se um dia foi achado, se um dia eu fui a chave que te abria o coração. Há quem te escreva versos agora, amor. Há quem te tenha por perto, quem te veja de perto, e eu, nessa brincadeira de destino e distância, apenas não posso mais.
Há quem te abrace, quem te beije todas as manhãs de frio e sol ao centro, há quem te segure pela cintura, e não sou eu. Há um mundo, e uma só pessoa ao seu redor, que não eu.
Como vou te olhar assim, perdida entre aqueles outros beijos, aquelas outras frases tão piegas quanto as minhas? Como vou te amar em voz alta, escrever sobre os seus traços e a minha saudade em caixa alta se você, você, meu amor, não me quer para todos? Como posso te suprimir em mim em noite de lua cheia, em noite de céu estrelado se, ao nascer do dia, eu sou o brinquedo guardado a sete chaves no fundo do armário? Como vou seguir assim, sentindo por inteiro e tendo uma confortável metade?
Eu não sinto assim, em parcelas e distinções. Entenda, amor, eu gosto de você de olhos abertos e fechados. Eu estou falando, olha pra mim, eu amo você. Eu apenas não posso.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Mais uma dose

por Keissy Carvelli

A tarde era uma dessas em que o tédio invade o quarto sem deixar espaço para qualquer outro ofício, a não ser o frio, que escapava dos ventos lá fora entrando pela fresta da janela clara que insistia em refletir o sol sobre minha cama todas as manhãs.
Chovia, abria sol, chovia, assim como tudo em mim. Num instante eu sorria, noutro seguinte trancava meus lábios e franzia os olhos involuntariamente, ainda que minhas conversas superficiais demonstrassem o contrário.
Ela notou meus desapegos e então pediu que eu não ficasse triste, assim como quem pede um chiclete no fim da noite. Pediu para não ser o motivo da minha tristeza, como se pedisse para não ser motivo algum.
Não era tristeza dessas sólidas que botam nos olhos rios de lágrimas e nos lábios o sal amargo das desventuras. Ou era. Mas as lágrimas e os olhos não, esses não eram.
Era uma decepção, um cansaço latente quebrando-me os ossos, recolhendo-me a pele; era um desajuste cretino maltratando minhas estruturas. Mas não era ela o motivo. Não o principal.
Eu, tudo começava e terminava nesse pronome tão pessoal. Estava descontente comigo, com essas mãos de unhas vermelhas, com esse cabelo molhado do banho quente, com esses pés frios e pequenos. Não estava triste, porque estar triste comigo mesma era querer sentir de mais, e eu, sinceramente, não queria sentir.
Estava estupidamente desacreditada de mim, porque eu, nesse infame jeito de ser, não conseguia sequer deixa-la ir. Para qualquer lugar que fosse, para qualquer abraço que a quisesse, eu não a deixava ir. Eu não podia ir a lugar algum.
Estava em náuseas porque eu, nessa brincadeira de gostar, acabei gostando demais, e gostando mais daquele beijo do que da minha própria boca. E por gostar de mais eu não me deixava partir; por gostar de mais eu não gostava mais de mim.
Era como uma dose de conhaque, dez doses de um álcool qualquer misturados a um maço inteiro de cigarros, ou qualquer sinônimo mais barato e medíocre: você sabe do dia seguinte, conhece o gosto amargo de ressaca em olhos baixos, não suporta o odor estúpido das mãos, do cabelo, do ócio; você sabe, com todas as letras e gestos, que o sono cairá sobre o corpo, que a cabeça parecerá mais pesada que o céu, mas, ainda assim, num próximo final de noite, trará um copo para mais perto, acenderá o cigarro com a outra mão, e se embebedará por toda a madrugada. Porque o gole na boca, e o gosto nos lábios, são ainda mais sutis que o amargo da lua caindo. O toque esperado é ainda mais sentido e amado que as divisões odiadas.

domingo, 20 de abril de 2008

Cor-de-menina

por Keissy Carvelli

Pacote fechado, embrulho colorido com um laço vermelho logo em cima. Não havia cartão, mas não era preciso, o silêncio das poesias gritadas aos quatro cantos evidenciavam todo o conteúdo e teor daquela caixinha levada pra casa, às pressas, por passos curtos e contidos.
Um pequeno soldadinho de chumbo foi tirado com cautela por aquelas mãos pequenas e olhos que sorriem. Ele era de chumbo, porém levava em seu rosto um sorriso desses lindos, com dentes perfeitos tão bem alinhados. Ele sorria por ver aquele sorriso.
A menina foi arrumando com delicadeza cada dobra da roupinha azul, e depois o chapeuzinho, e os sapatinhos até se converter ao olhar contente daquele pequeno boneco e ceder-lhe um beijo. Ele não era apenas um bonequinho de chumbo.
Foram dias assim, de paixão, de toques sutis, de conversas que duravam horas e mais horas, e elogios, canções, superstições...Eram dois juntos em um só, como se a vida inteira tivessem procurado um ao outro. Ele não se sentia mais como um bonequinho de chumbo. Ela não o deixava sentir sequer por um único instante.
Numa noite dessas, em que trocavam sentimentos, o soldadinho foi posto no baú cor-de-rosa, longe da cama, num canto qualquer. Ele não desconhecia o motivo, no entanto preferiu não entender.
Na noite seguinte o baú não foi aberto, a escuridão se prolongou por algumas lágrimas que caiam sobre aquele ausente sorriso. Ele não era apenas um soldadinho de chumbo, ele sabia. Tinha voz, e cantava, e sorria. Suas mãos não eram nem tão grandes nem tão pequenas, combinavam com as dela. Não, eu não sou só um soldadinho de chumbo. Eu amo.
É, ele estava certo. Não tardou para o baú ser aberto. Avistou com olhos brilhando aqueles cabelos caindo sobre o rosto, e aquelas besteiras ditas e ridas. Era ela, e ele sabia. Era ele, e ela sabia.
Trocaram os mesmos toques, as mesmas feições. As frases piegas não foram deixadas de lado. Ele cantou por um tempo, arrancou-lhe uma risada dessas de longos minutos. Tudo voltou ao normal e ele já imaginava os próximos dias, o sol nascendo, os beijos pelas tardes, e noites, e madrugadas, e o baú se fechou mais uma vez.
Aquela imaginação, a ilusão e as esperas foram trancadas naquele maldito baú velho e cor-de-rosa. Restou-lhe mais uma lágrima que não ecoava naquele silêncio. Ele sabia, ela tinha tantos brinquedos. Todos do mundo inteiro.
Uns tinham mais cor, mais charme, outros, ainda, ficavam logo ali naquela prateleira bem mais perto da cama do que ele. A culpa é do baú, quem mandou ficar tão longe?
Acostumou-se a viver entre as bonecas, a escuridão e as lagrimas. Não deixou de sorrir. Ela sempre voltava e botava naquele rosto cansado de brinquedo velho todos os sorrisos que poderiam existir. Ela sabia resgatar o amor do soldadinho de chumbo, por mais que ele jurasse de pés juntos, todas as noites, que se esconderia assim que uma luz viesse lá de cima. Ele fugiria, não deixaria rastro nem pistas. Nem ao menos desarrumaria o baú. Sairia assim que a lua tomasse o centro do céu e nunca mais dormiria entre lágrimas.
Ele não era só um soldadinho de chumbo. Ele amava, e todo bonequinho que ama, ainda que seja de chumbo, escreve poesias entre melancolias e sorrisos. Todo bonequinho que ama, cala ao entrar na grande caixa cor-de-menina, e toca-lhe os lábios ao sair.
Para ele era amor, não havia de ser outra coisa senão amor. Mas ele, ah...ele era apenas mais um soldadinho de chumbo jogado no fundo do baú.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Filantropia

por Keissy Carvelli

Ela tentou aceitar os fatos com um sorriso amarelo no rosto pálido e frio. O esforço só dissipou mais seus descansos, e o sorriso, não, ele não era amarelo. Antes fosse, soaria menos doloroso, menos piedoso e, quem sabe, despertaria um tom frígido de sarcasmo e ironia que ela tanto costumava jogar em suas frases soltas.
O sorriso não era inteiro, nem pela metade; era desses risos em pedaços, em frangalhos, de canto de boca sem mostrar os dentes, sem mostrar o sorriso. Ela era vulnerável, e sabia disso. Ela confiava de mais, e sabia disso. Ora, sua mãe passara a vida toda lhe dizendo: menina, você acredita muito nas pessoas, o mundo não é como você pensa.
Mãe, eu sei, eu sempre soube, mas não posso não saber, entende? Preciso acreditar, e não há outra coisa que eu possa fazer a não ser crer naquilo que me dizem. E, às vezes, nem é preciso dizer.
Ela tentou se projetar com seus 25 anos, talvez. Não demora tanto assim, é certo, porém até lá os dias são longos, e as escritas vazias e tão cheias dela mesma. Não obteve qualquer imagem sofisticada de roupas caras e emprego sofisticado. Ou teve. Mas como separar o seu imaginário real das suas expectativas platônicas?
Lembrou-se do professor de filosofia deixando escapar sutilmente que o tal Platão era um quase babaca, e que, bom mesmo, era Aristóteles. Qual é a desse cara que fica idealizando as coisas? É, Platão, deixar a caverna e as sombras para trás vai além de um simples conto. Talvez nós, eu e você, pudéssemos nos conhecer por aí, e idealizaríamos nossas paixões e por fim casaríamos. Não seria má idéia, não fosse por um fator ou outro.
Tentou aceitar o fato de que não há razão alguma, e interiorizou a vontade de não afear seus dias. Santa impaciência. Era isso, exatamente isso: demonstrava paciência com seus novos amores pela sua própria impaciência. Quanto egoísmo, menina. Talvez isso não te leve ao céu. Talvez isso não te leve a lugar algum.
Ela era assim mesmo, e todos sabiam. Tinha lá seus encantos, mas de magia, pouco, bem pouco. Temia, ainda, repetir-se. Por Deus, como ela era repetitiva. Chorava as mesmas lágrimas, os mesmos motivos, os mesmos clichês; poetizava as mesmas palavras, as mesmas rimas, os mesmos pontos, as mesmas vírgulas, o mesmo enredo em voz distinta.
Olhou sua cama desarrumada, seu quarto estrategicamente desorganizado e imaginou algum conto sobre essa coisa toda de vida nova, e liberdade, e cigarros, e álcool...Lá estava ela se repetindo outra vez.
Achava um charme citar cigarros e álcool em poesias e prosas. Achava um charme entrar madrugada a fora expondo em papel suas repetições infantis. Achava ainda mais charmoso levar um gole de café à boca a cada pausa literária, no entanto detestava café. È, ela não era tão charmosa quanto pretendia.
Ah, Platão, se eu te conhecesse. Passaríamos noites e noites mudando o mundo com os pensamentos enquanto os pés deixariam marcas no chão de terra batida.
Ela queria ser um pouco de Aristóteles, ela queria, mesmo! Talvez já esteja dando indícios e progressos para tal, ela sabe. Mas falta-lhe paciência, é o que dizem, e essa gente, sinceramente, diz de mais. Toda uma vida de paciência esperando pelo que “está por vir”, e nunca está, nunca é, nunca vem.
Menina, ouça o poeta: não há nada há ser esperado. Nem desesperado. Ouviu? Pois bem, agora durma, mas leia antes, isso te trará algumas idéias a mais.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Dois lados

por Keissy Carvelli

Esperei a noite cair, e o álcool entrar, e a melancolia sucumbir meus sentidos na tentativa de deixar as palavras escorrerem pelos dedos sem qualquer propósito, ou por algum, quem sabe.
Trocaria minha noite de sono pela distância em menor tamanho, e trocaria minha cama por um sorriso, por aquele sorriso. Ele seria pra mim, e meu, e soaria feito criança em dia de natal com olhos brilhando e mão trêmulas, e a pele ansiosa expondo aquelas expectativas.
Eu esperei por tanta coisa, por tantos anos e por fim continuo jogando minhas ilusões para o papel num começo de madrugada solitária e fria. Quisera eu ser fria o suficiente para não sentir, e não querer, não precisar. Quisera eu poder virar o pescoço e alcançar os teus olhos com os meus, logo ali, no mesmo lugar em que destruo minhas esperas.
Sou parasita de mim e dessas coisas todas que sinto, e , por vezes, gostaria de não ser exatamente como sou. Talvez eu fosse bem mais feliz.



domingo, 6 de abril de 2008

Do lado de fora

por Keissy Carvelli


Os pés descalços e sujos se arrastavam naquele chão frio daquela madrugada de tantas idas e vindas. O vento forte e ainda mais frio embaraçava os cabelos pretos jogados ao tempo como resquício do cansaço interior que sentia após tantos anos, tantos beijos, tantas palavras e histórias.
Não pude desvirtuar os pensamentos, tampouco as cenas que acabavam de acontecer. Aquela conversa precedida das mãos, e dos olhos fechados, e daquela vontade gritando em silêncio coisas que nós não queríamos ouvir, titubeava pela minha cabeça sem indícios de encontrar alguma solução ou explicação.
A maquiagem borrada enfeitava os olhos baixos e sonolentos que não procuravam nada por aquelas ruas longas e distantes de qualquer lugar. Estava longe de mais para me arriscar, mas perto o suficiente para não esquecer.
Aquela história toda de medo e subterfúgios não poderia me convencer a não esperar, não querer decifrar os reflexos dos espelhos postos em quartos distintos. Eu não deveria aceitar, mas há uma fresta de impotência corroendo minhas mãos.
Abri a porta num ruído discreto e logo pude aquecer meus pés com o carpete empoeirado da sala de estar e, num suspiro leve, retomei a consciência do que acabava de acontecer. Era eu, mais uma vez, o certo pelo errado. Era eu, mais uma vez, agora pelo inverso.
O cheiro de cigarro misturado ao álcool se alastrava por toda a minha pele, e aquela marca no braço esquerdo, aquele fim sem começo, aquele sorriso conformado saindo do meu rosto enchiam o meu apartamento de crimes e suspeitas.
Joguei meu corpo fraco na água quente do chuveiro lavando primeiramente os pés de quem dança, e anda e não chega a lugar algum. Esfreguei cada pedaço de pele na tentativa de tirar o perfume que ficaria preso em mim, no meu lençol, e no meu cobertor durante todos os meus sonhos. Prendi os fios que caíam sobre a boca tentando prever qualquer pretensão, qualquer senão.
O sol já começava a aparecer pelo vão da janela, os sinos da igreja lá do ouro lado acertavam a hora. Que horas são? Não, não queria pensar no tempo.
Troquei os pensamentos pela cama, cobertor, travesseiro e um pequeno fluxo de imagens de um passado recente que se dissipava no ar como aquele perfume que, em vão, tentei não lembrar.

segunda-feira, 31 de março de 2008

A mando

por Keissy Carvelli

Eu falo de amor, falo de amor, falo de amor e vou me embriagando aos poucos com esses sentidos efêmeros que dou a cada palavra, a cada termo que escapa de mim e chega ali, do outro lado, em outras mãos, em outras bocas.
Eu vou amando em silêncio, em poesia, em versos mudos suspirados nas expressões e demonstrações de importância. Ela se importa comigo. Ela sente mais do que diz, e diz somente o seu controle, sua linha reta sem devaneios. Eu devaneio, ela, às vezes.
Eu tiro os sapatos, jogo num canto aquele pedaço de tecido sujo e me desfaço em imaginários sólidos dos teus sorrisos e afetos. Eu sinto tanto quanto digo, e gosto de te imaginar sorrindo.
Eu vou perdendo o controle, ganhando sentido...A confusão eu confesso, não minto, há muito tempo me perdi num labirinto, e toda essa repetição e essa rima parecem patéticas quando o sono caindo sobre os olhos tateia e discorre palavras avulsas por entre minhas saudades.
Por hoje não me excedo; não acendo um cigarro. Por hoje eu vou sentindo a falta, e o frio, e o seu abraço eu não sinto. Por hoje eu vou sentindo vontade de te fazer sorrir com os olhos, como sempre costuma ser.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Passional

por Keissy Carvelli

Acendia um cigarro, e logo outro, e outro entorpecendo a cabeça daquela náusea esfumaçada e grotesca que lhe enchia de glória e vício. Não preenchia, no entanto, suas lacunas segmentadas de solidão e amores.
Jogava os cabelos longos pelo travesseiro fechando os olhos antes que suas pretensões lhe traíssem sem avisos prévios, e logo repousava em pensamentos ilusórios de menina grande que esqueceu de acordar.
Com um de seus dedos acariciou uma mexa daqueles fios bagunçados; com a outra mão tocou-se no rosto, na boca, tendo em visão conturbada a imagem fosca do teu maior amor. Repudiou-se pela cena patética, mas continuou ali, entre seus próprios afagos, entre suas próprias melancólicas, paixões; entre sua própria solidez em solidão.
Quis não afear seus dias, não esperar, não des-esperar; quis trazer pra perto não um sonho de uma noite, mas a precisão incerta de uma vida inteira. Quis ter e ser tida.
Só por aquela noite não poetizou seu interior; fez da quase ficção um apreço a mais, uma estratégia qualquer. Ela andava confusa até mesmo para escolher entre ler ou ser lida, escrever ou ser escrita.
Fechou ainda mais os olhos enquanto o afago triste de seus próprios dedos inquietos lhe tirava sutilmente o sono.

quinta-feira, 13 de março de 2008

Futuro do pretérito

por Keissy Carvelli


Trocaria meu travesseiro
Pelo teu sorriso criança,
Pelo teu brilho contido,
Pela tua alegria
De menina que dança.

Seria eu a madrugada de olhos abertos,
Seria você minha
De um lado, do outro
De dentro.
Seria eu o suspiro desastrado,
O juízo perdido,
Os teus amores,
Todos eles.

Seria eu o seu toque
Dos desejos escondidos;
A sua falta de escolha
Tão bem escolhida;
Sua denúncia breve
De afagos pequenos,
Camas desarrumadas,
E seus descompassos
Tão bem entendidos.

Sinto não ser para mim.
Não procura meus abraços
Quando o sol se faz caindo.
Não tropeça pelos beijos
Enquanto se faz pequena
Na sala e sofá.
Não vê meu sorriso
De tão bobo
Sorrindo.

Sinto não ser para mim.
Sinto sentir,
Mas não ser assim,
Minha.

terça-feira, 11 de março de 2008

Meu lado Bridget Jones

por Keissy Carveli

Nunca fui do tipo que teve/tem muita sorte, ou qualquer sorte, no âmbito emocional. Tá bem, eu nunca tive muita sorte em coisa alguma, mas nesse quesito amor-paixão-namoro-o-raio-que-o-parta eu disponho de certa superação. Não que eu seja uma virgem suicida daquelas que fazem listas das 100 coisas que precisa fazer antes de morrer e o primeiro item é “beijar na boca”. Por Deus, eu sou bem “descoladinha” até, e já tive lá minhas ficadas esporádicas e afins. Mas o propósito disso tudo não é esse.
Como eu estava dizendo, até entrar numa sessão “por favor, não achem que sou uma mal amada por completo”, nunca fui mesmo de ter sorte. Aos 7 anos não fui a garotinha que era apaixonada pelo menino lindo da sala e que era correspondida com bilhetinhos e chicletes no intervalo. Na verdade eu fui a garotinha apaixonada, só não era correspondida. Okay, até aí tudo ótimo, essas coisas acontecem mesmo, e nessa época eu não era lá o que se chamava de “a criança mais linda da escola”, apesar de ser bem popular.
Até os meus doze anos gostei desse mesmo “menino da sala” e, não se surpreendam, até os mesmos doze anos nunca, leiam pausadamente, N-U-N-C-A tive qualquer correspondência da parte do filha-da-puta.
Ah, coisas de criança, dirá você, quando crescer passa. Uma ova! Nunca tive um namorico desses dos 16 anos cheio de clichês, bilhetes, músicas, declaraçõezinhas, chocolates e um coelhinho na páscoa, coração de pelúcia no Natal, cinema com pipoca, beijos e coca-cola. Mas é adolescência, passa! AHAN!
Não sei se a compreensão é fácil, abdiquei as metáforas, sinestesias, e poesias nesse relato-bem-humarado-do-meu-mal-humor que é pra não restar dúvidas. Em caixa alta: EU NÃO TENHO SORTE, ponto final, próximo parágrafo.
Aos 16 não tive um namoro bobo, não terminei aos 17, não sofri um ano todo como qualquer outra (se bem que as pessoas de sorte, no mínimo, sofrem 3 meses, mas isso não vem ao caso), não achei que o mundo iria acabar, e que o meu amor era o maior que existia na galáxia inteira. Aos 18 não conheci a pessoa perfeita, não entendi sobre amor, não recebi presente de aniversário, nem beijo, nem abraço à meia noite. Não tive qualquer demonstração de presença sólida interna, externa e ao lado.
Talvez seja alguma conspiração dos astros, não, não, isso seria passageiro: o ano do inferno astral e, no meu caso, bota anos nisso. Acredito que tenha sido logo quando eu nasci. Naquele sábado de oito de janeiro de mil novecentos e oitenta e nove, ás três e trinta e cinco da madrugada plutão entrava no ano 6, com fluxos de energia em saturno, que estava em escorpião, e a lua estava minguante, o que a astrologia define como: vai pro diabo que te carregue, você acaba de nascer e desista, nunca vai ser feliz no amor. Olha lá, os astros já sorriam sarcasticamente pra mim, e o médico dizia: olha que criança linda! Cuidado, papai, você vai ter um trabalho danado com essa menininha dos olhos verdes.
Ah, se não fossem as bebedeiras e as mentirinhas, meu pai nunca teria tido trabalho algum, senhor doutor!
E não pensem vocês, caros leitores que possivelmente estão rindo e me achando uma gracinha de menina, que não há como piorar. Eu passei todos esses anos, em que todos estavam namorando e eu escrevendo, ouvindo que alguém um dia ainda teria muita sorte de me encontrar. E que alguém ainda me faria muito feliz. E que eu era a pessoa mais perfeita que já conheceram. E até mesmo a minha psicóloga, vejam vocês, já disse: “você tem uma sensibilidade incrível, nunca perca isso, e não se apresse, as coisas acontecem”. Quer saber? Vão tomar reticências.
Nunca fui mesmo de muita sorte, tenho me distraído com os sentimentos platônicos, tenho escrito sobre amores distantes, solidão compassada; tenho desejado sem poder, amado sem querer, beijado sem prazer; tenho mantido a ironia, o riso ; tenho pintado as unhas de vermelho, o cabelo eu não pinto, nos olhos a lágrima eu escondo, e no tempo eu já nem acredito mais.
Tenho sido patética, extremista, platônica, publicada, mal amada, auto destrutitva, sarcástica; tenho sido patética, patética e poeta. E, antes de nascer, perguntaram-me com voz de anjos em nuvens de algodão: quer ter amor ou poesia? Adivinhem só o que eu escolhi.

domingo, 9 de março de 2008

Personificação

por Keissy Carvelli

Essa brincadeira tola de abusar de uma racionalidade antes desconhecida custa uns bons pedaços daquilo que antes era inteiro, excesso, extremo. Proseia-se a poesia, solidifica os suspiros, dilui os sonhos de olhos abertos, cria-se uma espécie de teoria bem desenvolvida para qualquer coisa que seja sentida. Nessa brincadeira de não brincar, o soco silencia, o afago é escondido, a volta em círculos retoma em linha reta, a inércia é o comedido sem escrúpulos, e a roda gigante não é mais a atração principal do parque de diversões.
São horas para um único verso, muitos cigarros para vários vícios, e um só vestígio para todas as noites.
Ra-ci-o-na-li-da-de sem qualquer rima, sem apreço, sem um preço, prestação. Por vezes querendo fugir, por outras querendo encher a cara de um sadismo superior, uma ironia podre, sem classe. Por todas as vezes precisando de um pedaço inteiro, de um amor inteiro, completo, concreto em subjetividade; não uma mão, um beijo, um senão, uma contrapartida coesa, mas um deslize, uma insanidade, uma precisão.
São horas para uma única prosa. Essa racionalidade ou me alitera ou personifica.

sexta-feira, 7 de março de 2008

Subjetivamente

por Keissy Carvelli

Brinco com um porta copos e um cinzeiro bem dispostos e de fácil acesso a qualquer uma de minhas mãos. Tomo uma cerveja, e talvez eu acenda um cigarro; talvez eu cante algum refrão ou quem sabe eu saia por aquela porta, botando um pé atrás do outro num ato estritamente mecânico. Talvez eu não faça coisa alguma e prossiga nessas confusões literárias de ser, estar e querer.
Acho subjetivamente interessante essa imagem da menina sozinha num final de tarde tomando uma cerveja em seu quarto ouvindo qualquer "balada do amor inabalável" deixando a noite cair, e cair, e cair, e os olhos abertos decifrando todo pensamento oblíquo surgido no imaginário real e inconsolável sobre qualquer aspecto. Penso que essas cenas deveriam fazer parte de um filme, e antes que a música acabasse, surgiria um telefonema que a faria sorrir por horas, e então mudaria o repertório, dançaria no quarto, e sonharia em devaneios conscientes, e se embriagaria do prazer doce daquele "romance ideal", ainda que só nos sorrisos.
Mudo de parágrafo e logo chego a conclusão de que não há finalidade alguma nisso tudo, nessa prosa, nesse ácool, nessa precaução, nessa falta de tema. Substancialmente não há nada pra ser dito. Assinei, há pouco, uma revista mensal, e creio ser um passo importante tal qual comprar um carro, uma casa. É um tipo de "adultismo", se é que me entendem. A gente sai de casa, faz um cartão de crédito, entra na faculdade, procura estágio, compra cervejas, acende um cigarro no quarto e logo está ali, assinando uma revista jornalística para ler todo mês ao tomar café, ainda que eu não seja adepta do café preto em si.
Sinto não ter uma conclusão. Talvez eu abra outra cerveja e tenha orgasmos mentais com a tal da liberdade, com a tal da assinatura da revista. Sinto não ter uma conclusão, obrigada.

terça-feira, 4 de março de 2008

Desculpe, não encontro a expressão

por Keissy Carvelli

"Desculpe mais um clichê,
Mas paixão é sempre assim:
Um bom motivo pra escrever"

Não beirava o abismo; não soltava suspiros perdidos por entre os dias de saudade. Gozava da plena lucidez tátil, distante o bastante dos extremos de outrora; distante daqueles delírios em suor frio, e das encenações metafóricas diluídas em sentimentalismos eu era um saudosista, um nostálgico consciente.
Não espreitava qualquer ataque insano que pudesse me desfazer em lágrimas por meses a fio; não soluçava amores caídos de paixão pela boca trêmula de tristeza; não era a inconseqüência transitória entre o desespero e a necessidade.
Era o pensamento noturno daqueles beijos calmos e escondidos; era a saudade afugentada no peito, camuflada na racionalidade estúpida e real; era o corpo sentindo o perfume doce dos dias de sol e céu claros.
Era eu dizendo “não espero nada de ti” querendo um abraço longo; era eu desdenhando teus sinais em prol da minha estabilidade; era eu deixando a água correr, deixando a água doce tomar o lugar do sal e cair ao chão num silêncio mundial dos sentidos. Era eu dizendo em tom clichê: “não espero muito de você, tampouco nada; espero você”.
Era eu fabricando impressões, decidindo expressões das melhores lembranças e saudades de você.

segunda-feira, 3 de março de 2008

Poema em linhas tortas

por Keissy Carvelli

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus companheiros têm sido amados
E afagados pelas mãos suaves dos amores contidos.
E eu, sempre tão infantil,
Eu, por tantas vezes esmagado pela indiferença
Sutil e piedosa dos desamores;
Eu, tantas vezes perdido no descontrole
Firme dos meus devaneios intensos;
Eu, que tenho acabado sujo, desprotegido,
Vulnerável e mesquinho;
Que tenho derramado dos lábios um prazer doce,
Que tenho sido patético, submisso aos meus sentidos,
Que tenho sofrido madrugadas de solidão a dois;
Eu que tenho sido o piegas sonhador,
Que tenho tropeçado nos traços delicados de outra pele,
Eu verifico que não tenho par nisso tudo nesse mundo.

Mas meus companheiros não!
Ah, esses bem amados!
Comedidos e malditos!
Não perdem uma lágrima em desespero,
Não sussurram em gritos soltos
Promessas descabidas de amor eterno;
Não fraquejam em beijos de pernas trêmulas,
Não se entregam aos clichês dos versos em exagero.

Não, todos são comedidamente amados!
Jogadores sim, mas estupidamente apaixonados, nunca!

Argh!Estou farto desse sentimentalismo concreto,
Dessas paixões sem melodia, sem olhos e brilho.
Onde há intensidade nesse mundo?
Então sou o único inconseqüente e irracional dessa terra?

Ah, bem amados e coesos.
Podem terem sido covardes, mas sofridos de amor nunca.
E eu, que tenho sofrido sem ter sido amado,
Que tenho sido ridículo sem ter sido covarde,
Como posso eu escrever de amor?
Eu, parasita do que sinto,
Eu, que por um toque
Tenho me desfeito em sorrisos,
Eu, que tenho sido estúpido
Estúpido no sentido infantil da paixão.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Let it go

por Keissy Carvelli

"Waking up this morning thinking maybe this can´t be real..."

domingo, 24 de fevereiro de 2008

O dono da Ilha

por Keissy Carvelli


Amanheceu com os planos fixos soando feito bocejos numa manhã calma de um dia incomum dos últimos 50 anos. Não sorriu, tampouco demonstrou qualquer exaltação de humor nas rugas do seu rosto já cansado e da sua barba, já não tão espessa quanto outrora, não se moveu um só fio.
Os passos, que na guerrilha marchavam clamando revolução, eram agora tímidos e suavemente lentos sem alvo concreto; os pés não calçavam botas de combate, mas chinelos confortáveis de uma vida enferma e, naquela decisão difundida, um velho idealismo.
Era ele, o ditador, o chefe da revolução ditando sua retirada estratégica do alto da torre. Era ele pendurando as botas de couro de tantas lutas e doutrinas no fundo do armário. Era ele, o mito comunista, afastando-se do comando da ilha. Era ele, mais uma vez, fazendo história.
O que ninguém percebia, ou melhor, o que ninguém gostaria de saber, é que as barbas foram postas de molho, os peões serão trocados, mas o dono do jogo não. Será ele, ainda que por trás das câmeras, o protagonista da cena, fiel e Fidel.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Por um fio

por Keissy Carvelli


Desci as escadas como se voasse sobre a cidade inteira, tendo em minha frente uma luz opaca de fim de tarde, aquela que diz que está cedo de mais para os sentimentalismos e tarde o bastante para qualquer bocejar de sonos esquecidos. Em uma das mãos um cartão, na outra um aparelho moderno, desses que desfaz a distância, e, no pequeno espaço entre aquela quase lágrima e um pequeno sorriso, uma distração.
Ainda de roupas velhas botei os pés pela rua sem qualquer possibilidade de timidez e logo meus dedos discavam aqueles números tão fáceis já gravados numa memória detalhista. Alô? Quem fala? A voz segura e impostada respondeu sem titubear nem demonstrar qualquer fragilidade. Identifiquei-me não pelo nome, não por um apelido, deixei apenas que escutasse o timbre que define minhas palavras e naquele exato momento aquela segurança que outrora me atendera dava espaço ao tremor doce daqueles suspiros.
Por pouco, muito pouco, não senti aquela lágrima presa do outro lado da linha escorrer pelo rosto pequeno e logo cair em meus dedos. Por pouco ela não se entregou à minha voz. Essa voz às vezes rouca, às vezes irritante; essa voz que imprimi poucos sons não ritmados quase provocou o choro sufocante, quase trouxe para os meus braços a fragilidade inteira daquela que tomava meus pensamentos.
Não. Não fui a causa. Seria desprezível provocar nela sequer um soluço triste. Fui tão somente o apego, o colo ainda que invisível; fui a preocupação e o desejo de amenizar. Fui somente aquilo que eu já era, e por alguns minutos fui o abraço imaginário.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Uma rima, nenhum refrão

por Keissy Carvelli


Não. Só por hoje não vou dizer
Só por hoje vou fingir
Não gostar de você.

Muda, muda, muda

por Keissy Carvelli

Arruma o quarto, lava a louça, limpa o chão. Faz a compra do mês: detergente, arroz, pimenta, sal, sabão. Pratos, panelas, panos, princípios, pedaços aqui, partes ali. Faz o almoço, guarda dinheiro, acorda cedo, sente saudade, sente vontade, sente paixão.
Veste-se em sua casa, em sua rua, em seu pedaço pequeno de liberdade. Dorme em seus sonhos sem critérios, sem funções, sem qualquer ordem. Há apenas um motivo/razão.
Cruza uma, duas avenidas; logo acende um cigarro e deixa queimar no rosto um sorriso longo, daqueles que se estendem daqui até onde ninguém pode alcançar. Daqueles que o vento bate e logo sente inveja. Daqueles que dizem, gritam em silêncio.
Acorda e tudo está ali, sob seus pés, seus olhos. Não, menina, não é mais um sonho maluco de madrugada.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

por Keissy Carvelli


Eu não sabia o que dizer, sendo assim boto meu melhor sorriso, minhas tímidas lágrimas e solto um "tchau, até mais" com medo do que eu vá sentir.!

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

A Pequena Dos Sonhos

por Keissy Carvelli

Ela escrevia incansavelmente sobre amor, paixão, solidão e cultivava em seu interior um álbum completo de frases bobas que surgiriam sem critérios nem planejamentos. Ela sonhava feito uma criança na pré-escola, via borboletas por entre as flores, andava pelas ruas calmas do seu bairro, onde o vento batia suave fazendo mexer as folhas de todas aquelas árvores. Ela não ouvia nada, nenhum ruído a não ser o cantar dos pássaros que enfeitavam o seu jardim, e ah... essa menina dos sonhos poderia passar horas observando seu jardim verde e cheio de pétalas, brincadeiras, lembranças. A Dos Sonhos era exatamente assim: um jardim calmo e calado, sussurrando poesias quando o sol caía, sendo abrigo para pássaros e borboletas efêmeros que num instante estavam ali, pousando sobre a grama, e no instante seguinte levantavam vôo num adeus ligeiro, sem abraços nem apegos. A Dos Sonhos era esse jardim.
Aquela, a outra: A Pequena, vou chamar assim, não escrevia sobre amor e raras vezes demonstrava uma melancolia mórbida. Ela era doce, encantadoramente doce, como se sua quase ingenuidade soasse pelos seus olhos da forma mais pura que pudesse existir. Ela não sonhava muito, gargalhava mais, talvez por medo, por timidez. Talvez suas risadas eufóricas fossem a máscara perfeita para toda a proteção: oras, ela era pequena, e toda pequena teme se machucar. Vivia entre as gentes, carros. Seus ouvidos eram bem acostumados a todo esse barulho de vida; seus passos conheciam ônibus, frio, chuva, céu nublado. Ah, A Pequena, era como um parque de diversões: sempre alegre, inundada de atrações, pessoas, amores suplicados, amores não entendidos, rodas gigantes, montanhas russas. A Pequena era esse parque de diversões.
A Dos Sonhos tinha mais certezas do que ações, desenvolvia teorias incríveis sobre como, quando e o porque de todas as coisas que poderia ou não sentir. Ela analisava o perfil de todos os candidatos da próxima eleição e não a perderia por nada: ela amava política, e sempre pensou em se candidatar a algum cargo, não fosse pelos esquemas medíocres que isso implicaria. A Pequena não. Ela pensava em casar e ter filhos com o menino mais lindo do mundo que entenderia seus ciúmes e cairia em seus jogos de provocações sempre tão previsíveis e intrigantes. A Dos Sonhos também queria um casamentos, filhos, família, viagens, entretanto não com o menino mais lindo do mundo.
A Dos Sonhos era um extremo, A Pequena um quase equilíbrio. Elas talvez exibissem algum complemento.
Elas tinham idéias de amores distintas, desejos de amores distintos, medos de amores distintos, seguranças, auto-estima distintas. Elas eram mesmo distintas. Em comum o signo, ainda que A Pequena não acreditasse muito nessas coisas de zodíaco e combinações. Suas magias eram distintas.
A Dos Sonhos era tão inconseqüente ao ponto de querer A Pequena todo o tempo, ao ponto de perder madrugadas imaginando um só beijo e então tudo faria sentido. Ela era mesmo uma inconseqüente. Avisem A Dos Sonhos para ela ter cuidado, A Pequena não se entrega assim. Avisem! Corram! Quem sabe haja tempo o suficiente. Tarde de mais. Elas, nas incompatibilidades, encontraram-se pelo destino quebrado de uma e pelas vitórias da outra. Transformaram todas as birras, e brincadeiras, e distrações numa forma incrivelmente encantadora de falar sobre sentimentos.
A Dos Sonhos escrevia incansavelmente sobre a vontade terna de ter A Pequena sob seus olhos, seus risos. A Dos Sonhos não fazia a menor idéia do que poderia acontecer, e fazer idéia alguma era se precipitar em demasia.
A Dos Sonhos e A Pequena não eram opostos, nem tão iguais assim. Elas eram A Dos Sonhos e A Pequena, e tudo mais que isso poderia significar.