terça-feira, 31 de março de 2009

Dedicatória

por Keissy Carvelli

Tantas luas se passaram

do seu último ‘eu te amo’.

Não lembro, ao menos,

qual fora o de adeus,

aquele saído dos teus olhos

e do teu coração.


Leio as dedicatórias

desses livros estúpidos.

Mas só há uma, uma!

De todos aqueles que me dera,

um tem poesia e teu nome

juntos

.

Tua letra redonda,

teu amor declarado,

tua inicial escondendo teu nome.


Tantas luas se passaram

e não ouço sequer a sua voz.


Há outra menina

pra quem teus sussurros

no meio da noite

atormentam o sono.

Há outra mulher

pra quem diz amores

e esconde paixão.


Não sei onde nos perdemos.

Talvez a falta de poesia,

de pele, tato, amor.


Sei onde eu te encontrava

e ainda me vejo perdida por lá

procurando, quem sabe, um olhar,

um sorriso teu que me fale de amor.

Ainda me vejo perdida

procurando esquecer uma saudade,

um olhar,

o sorriso teu que me falava do nosso amor.


Estes meus versos, meu amor

não são tristes.

Não há lágrimas correndo em meu rosto,

não há dor sufocando meu peito.


Estes meus versos, meu amor

são inteiros saudade.

E saudade, meu amor,

saudade dói mais que lágrima,

mais que ciúme de outra mulher.

Saudade, meu amor,

saudade.



domingo, 22 de março de 2009

Monólogo de um velho amor louco

por Keissy Carvelli

Eu procurava pelo brilho.

O brilho capaz de encontrar o meu sem nenhum ruído, com alguma dor. Não há brilho capaz de encher os olhos sem enchê-los também de lágrimas longas jogadas no travesseiro.

Eu procurava o brilho que só eu entenderia e saberia traduzir numa noite calma, seja ela de chuva ou estrelas. O brilho que me acordasse antes do sol nascer e não me deixasse dormir antes da lua morrer. O brilho das peles suando mesmo com a janela aberta, mesmo de olhos fechados.

Eu procurava pela intensidade na distância, na penetração das mãos, no mais fugas dos sorrisos. A intensidade ingênua e maliciosa de poses e posições singulares, de livros e sonhos divididos, de todas as vontades e orgulhos entendidos.

Eu procurava pelo silêncio mútuo, pelas risadas altas e sussurros sincronizados. Procurava de olhos atentos em todos os lugares em que pisava o grito discreto para a música certa, os fios do cabelo bagunçados para a dança incerta.

Procurei em becos perdidos, castelos em ruínas, em capitais planejadas, sujas, no interior de toda essa gente de palavras fáceis e paixões duras.

Acendo um cigarro, trago, solto a fumaça. O brilho desses olhos quase claros já se mostra fosco e cansado. Minha pele deforma minhas expressões, não submete qualquer impressão. Os fios do meu cabelo não têm mais cor, nem força, e nem sequer se movem em contratempo. Continuam estáticos e só quem dança são meus pés num ritmo desacelerado para não vencer o coração.

Música eu já não ouço. Todos os meus velhos discos trazem nostalgias de sorrisos e momentos daqueles amores quebrados dentro do peito que não deixa escapar uma só lágrima, mas deixa molhar por dentro.

Outro cigarro, mais uma ruga no rosto quieto e sereno. Mais uma partida não ganha de um jogo perdido e sem sentido. Velha. Velha. Velha.

Ouço minha voz rouca, minha tosse grosseira, minhas palavras de adeus. O tempo não espera a solidão de toda uma vida buscando somente o brilho. Meu relógio de pulso antigo eu já não sei onde foi parar. Nunca contei o tempo, contava amores, entre eles, as paixões. Eram as horas, os minutos e os segundos os suspiros saídos somente do meu pulmão.

Uma velha maldita por entre os anos e mulheres. Só eu ouvia os sinos tocarem sem ter uma religião, só eu dizia sobre amor sem tem qualquer relação. Era o brilho, a intensidade das minhas veias saltando pelo peito e por onde mais tivesse uma lembrança que me fizesse cantar sambas inteiros num só dia.

Mais um cigarro, dois tragos, solto a fumaça vagarosamente para inebriar todo esse vazio.

Não me encarem com esses olhos estranhos. Eu tive um amor. Não desses de filmes com trilhas sonoras contentes e formais. Era mais como um conto escrito numa madrugada, às vezes às pressas, outrora em meses seguidos. Tinha também uma trilha sonora bonita, suave, um blues pra mim, uma guitarra distorcida pra nós.

Foi um amor de encher os olhos do sublime ao grotesco; de sentir o calor forte na presença e a frieza mórbida da ausência, um amor de sentir saudade. Foi um amor de todas as fases. Começou criança, cheio de besteiras e graças; música para o beijo, poesia para a paixão, cartas escritas, absurdos trocados, dores caladas. Cresceu pelas pernas e gemidos abafados; pelo soneto, pela composição de todas as memórias, pelo desejo não controlado de tantas vezes perto e já não era mais o amor infantil. A conversa fria, racional, o adeus distante e cartas guardadas; a embriaguez escondida para não dizer infortúnios, dois sorrisos fechados daquilo que não era mais criança. Ninguém sabia e ninguém viu.

Eu tive um amor, mas quando ela se foi levou junto do seu peito o meu intenso brilho preso nos olhos e em suas mãos.


quarta-feira, 18 de março de 2009

Pronome Feminino

por Keissy Carvelli

Eu nunca soube não amar.

Amar, pra mim,

poeta de lágrimas

e risadas sarcásticas,

É brilhar os olhos

E hormônios.

É sorrir e gozar,

Tremer e suar

Sob o sol, lua, luar.


Eu nunca soube não amar

Com as mãos e coxas.

Com um suspiro

A cada porção de desejos.

Eu nunca soube amar sensata,

Sem dias, só madrugadas,

Poesia ou sonata.


Amor pra mim

Tem perfumes, estantes e discos.


Amor é toque

que foge da pele

E invade a carne;

Um toque dos sorrisos

sem antes sentir a pele.

Um toque de olhos fechados

e braços distantes,

De subjetivo, verbo, ação.


Amor pra mim,

poeta de lágrimas

e risadas sarcásticas,

São três suspiros

para cada segundo

do beijo.


domingo, 15 de março de 2009

Memórias de uma noite passada

por Keissy Carvelli

Porra, o que você tá fazendo? Você tá me perdendo e nem se importa, não liga, não xinga, não chora. Porra, será a saudade só minha? Essa nostalgia recente de todas as noites, da embriaguez, da turbulência estranha, são só minhas? Porra, menina, você ta me perdendo e nem percebe.

E agora vem esse menino de pouco mais de vinte anos e me diz essas coisas. Faz poesia, bossa nova, olha nos olhos, sente o meu perfume, mas é o teu cheiro que eu sinto. Ele diz que é paixão, encantamento, sei lá. Eu não quero ouvir. Era você quem deveria dizer todas essas coisas estranhamente apaixonantes.

Porra, o que você tá fazendo? Ele não tem os teus traços, não tem a tua pele, tua mão pequena. Ele não tem teus segredos, tua segurança, tua infância. Os teus livros ele tem, um pouco mais, talvez. Canta Vinícius, Raul, Chico, Cazuza. Canta qualquer coisa que soe bonito o suficiente nessas cordas, mas não tem tuas birras, tuas irritações.

Eu nem me reconheço mais, essa é a verdade. Não temos nada em comum, não temos a mesma paciência, a mesma vontade, os mesmos critérios. Não temos uma à outra. E agora vem esse menino de fios bagunçados, sorriso confuso, olhos fechados. Vem com essas poesias, e eu entendo. Vem com essas metáforas, e eu sorrio. Vem com essa paixão e eu não sinto.

Porra, você tá me perdendo e eu não quero. Eu sinto falta do teu beijo, do teu abraço, e não desses que eu encontro por aí. Sinto falta do teu sorriso, e dos teus olhos. Porra, você quer me perder.


quarta-feira, 11 de março de 2009

Estante vazia

por Keissy Carvelli


Eu vou tirar as tuas fotos da parede da minha casa pra não ver tuas digitais presas por onde quer que eu passe. Eu vou rasgar meus livros e deixar vazia a estante pros teus detalhes não perturbarem meu sono quase indecente de menina que dorme, mas não sonha. Eu vou esconder as cartas escritas e não mandadas; os discos eu vou riscar pra não te ouvir a cada letra; as frases e sonetos eu vou transformar em samba, choro e não assinar pro teu nome não ser descoberto pelo meu.

Eu vou guardar o violão e tocar uma gaita. Vou me desfazer dos teus presentes, vou desprezar Beatles e Sentimental. Café eu não tomo mais, cigarro eu fumo assistindo televisão; filmes eu não vejo para não concordar com a sua opinião.

A tua blusa eu uso pra te imaginar sem ela; os teus traços eu desenho ao acordar e o telefone eu já não espero tocar. O teu perfume eu ainda sinto por perto, a tua risada eu ouço no meu ouvido, o teu número eu ainda sei sem procurar.

Eu vou perder as músicas e escrever um livro. Teu nome eu posso esconder, te invento um outro qualquer, te deixo indefinida, quem sabe. Vou lançar de bom humor, sarcasmo e autodestruição. Eu sei que não gosta. Vou criar um outro final. Não! O final será o mesmo trecho do início. Assim. Eu vou te escrever um livro e você nunca vai saber.

A faculdade eu vou largar, mudar, sei lá. Vou te encontrar por acaso e fingir não te reconhecer. Vou te convidar para um café e pedir uma cerveja. Vou perguntar da sua vida e não contar absolutamente nada sobre a minha; vou estampar nos olhos nostalgias baratas sem você notar. Vou ser um clichê e parecer o contrário.

Eu vou rasgar meus livros e deixar vazia a estante pros teus detalhes não invadirem os meus dias inteiros. Eu vou fingir não sentir a sua falta.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Um pedaço escrito

por Keissy Carvelli


Pode gritar infâmias. Vai, pode chamar de puta essa menina estranha jogada na cama com olhos borrados da maquiagem da noite passada. Esbraveja meu nome pela janela e conta pro mundo inteiro todos os amores ditos no meu ouvido e diz o que você fez agora.
Pode me chamar de infantil, grosseira, grotesca, puta, ridícula, passional, hiperbólica. Grita bem alto. Eu quero ouvir tudo sair da tua boca. Todo o seu cansaço, toda a sua indisposição, o seu desamor eu quero ouvir de perto. Quero sentir o perfume da tua indiferença em silêncio, bem aqui, afogada nessa cama estúpida, com esses olhos estúpidos borrados, esse esmalte pela metade, e essa ressaca presa nos fios do meu cabelo.
Olha bem pra mim, meu amor. Diz todos os seus pensamentos rudes sobre mim, eu posso sentir você tremer os lábios desejando jogar todos eles na minha cara. Não, não, não. Você não faria isso, não é? Talvez você me queira no mês seguinte, talvez sinta a minha falta antes de dormir e não soaria bem me pedir pra voltar diante de tantos adjetivos empregados grosseiramente.
Pode me acusar das tuas loucuras, de traição, exagero, desapego. Me acuse de erros gramaticais, pronome oblíquo não inicia frase. Rasgue minhas cartas, apague meus poemas, minhas músicas. Diz com a tua frieza que não sou o que você quer, que sou estúpida, neurótica, ignorante.
Apague todos os meus indícios, e as tuas saudades. Esqueça das nossas manhãs e nossos risos; esqueça as mãos dadas timidamente e todos os minutos em que olhei pro teu rosto pra não esquecer na distância. Me chame de puta neurótica e esqueça nossas brigas e nosso sexo.
Não lembre mais do meu imperativo irritante, das minhas gírias, da minha voz, do meu suor. Esqueça qualquer coisa que te faça lembrar de mim. Pode esquecer também nossa única noite, nossa único filme não visto, nossos muito cigarros e as flores tão clichês que eu roubei dos canteiros da cidade.
Esqueça o amor-perfeito, o suco, e as esperas na porta do prédio onde você trabalha. Deixe passar os abraços fortes de despedidas, e os abraços fortes de reencontro. Não encoste mais em parede alguma para não sentir o meu corpo junto do teu e não feche os olhos, amor. Não feche os olhos para não me sentir segurar teu rosto e beijar tua boca.
Esqueça tudo, esqueça até meu nome, meu amor. Deixe, ao menos, essa parte pra mim. Deixe eu fazer o que quiser com esses fragmentos de coisa alguma; deixe eu me perder em poesias e pensamentos melancólicos pelo tempo que me for necessário. Deixe as saudades, as brigas, os beijos e afagos pra mim. Não pretendo ser rude, meu amor, mas eu quero até mesmo o meu egoísmo de volta. Deixe eu me querer de volta. O que é nosso eu já não posso mais querer.