segunda-feira, 31 de março de 2008

A mando

por Keissy Carvelli

Eu falo de amor, falo de amor, falo de amor e vou me embriagando aos poucos com esses sentidos efêmeros que dou a cada palavra, a cada termo que escapa de mim e chega ali, do outro lado, em outras mãos, em outras bocas.
Eu vou amando em silêncio, em poesia, em versos mudos suspirados nas expressões e demonstrações de importância. Ela se importa comigo. Ela sente mais do que diz, e diz somente o seu controle, sua linha reta sem devaneios. Eu devaneio, ela, às vezes.
Eu tiro os sapatos, jogo num canto aquele pedaço de tecido sujo e me desfaço em imaginários sólidos dos teus sorrisos e afetos. Eu sinto tanto quanto digo, e gosto de te imaginar sorrindo.
Eu vou perdendo o controle, ganhando sentido...A confusão eu confesso, não minto, há muito tempo me perdi num labirinto, e toda essa repetição e essa rima parecem patéticas quando o sono caindo sobre os olhos tateia e discorre palavras avulsas por entre minhas saudades.
Por hoje não me excedo; não acendo um cigarro. Por hoje eu vou sentindo a falta, e o frio, e o seu abraço eu não sinto. Por hoje eu vou sentindo vontade de te fazer sorrir com os olhos, como sempre costuma ser.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Passional

por Keissy Carvelli

Acendia um cigarro, e logo outro, e outro entorpecendo a cabeça daquela náusea esfumaçada e grotesca que lhe enchia de glória e vício. Não preenchia, no entanto, suas lacunas segmentadas de solidão e amores.
Jogava os cabelos longos pelo travesseiro fechando os olhos antes que suas pretensões lhe traíssem sem avisos prévios, e logo repousava em pensamentos ilusórios de menina grande que esqueceu de acordar.
Com um de seus dedos acariciou uma mexa daqueles fios bagunçados; com a outra mão tocou-se no rosto, na boca, tendo em visão conturbada a imagem fosca do teu maior amor. Repudiou-se pela cena patética, mas continuou ali, entre seus próprios afagos, entre suas próprias melancólicas, paixões; entre sua própria solidez em solidão.
Quis não afear seus dias, não esperar, não des-esperar; quis trazer pra perto não um sonho de uma noite, mas a precisão incerta de uma vida inteira. Quis ter e ser tida.
Só por aquela noite não poetizou seu interior; fez da quase ficção um apreço a mais, uma estratégia qualquer. Ela andava confusa até mesmo para escolher entre ler ou ser lida, escrever ou ser escrita.
Fechou ainda mais os olhos enquanto o afago triste de seus próprios dedos inquietos lhe tirava sutilmente o sono.

quinta-feira, 13 de março de 2008

Futuro do pretérito

por Keissy Carvelli


Trocaria meu travesseiro
Pelo teu sorriso criança,
Pelo teu brilho contido,
Pela tua alegria
De menina que dança.

Seria eu a madrugada de olhos abertos,
Seria você minha
De um lado, do outro
De dentro.
Seria eu o suspiro desastrado,
O juízo perdido,
Os teus amores,
Todos eles.

Seria eu o seu toque
Dos desejos escondidos;
A sua falta de escolha
Tão bem escolhida;
Sua denúncia breve
De afagos pequenos,
Camas desarrumadas,
E seus descompassos
Tão bem entendidos.

Sinto não ser para mim.
Não procura meus abraços
Quando o sol se faz caindo.
Não tropeça pelos beijos
Enquanto se faz pequena
Na sala e sofá.
Não vê meu sorriso
De tão bobo
Sorrindo.

Sinto não ser para mim.
Sinto sentir,
Mas não ser assim,
Minha.

terça-feira, 11 de março de 2008

Meu lado Bridget Jones

por Keissy Carveli

Nunca fui do tipo que teve/tem muita sorte, ou qualquer sorte, no âmbito emocional. Tá bem, eu nunca tive muita sorte em coisa alguma, mas nesse quesito amor-paixão-namoro-o-raio-que-o-parta eu disponho de certa superação. Não que eu seja uma virgem suicida daquelas que fazem listas das 100 coisas que precisa fazer antes de morrer e o primeiro item é “beijar na boca”. Por Deus, eu sou bem “descoladinha” até, e já tive lá minhas ficadas esporádicas e afins. Mas o propósito disso tudo não é esse.
Como eu estava dizendo, até entrar numa sessão “por favor, não achem que sou uma mal amada por completo”, nunca fui mesmo de ter sorte. Aos 7 anos não fui a garotinha que era apaixonada pelo menino lindo da sala e que era correspondida com bilhetinhos e chicletes no intervalo. Na verdade eu fui a garotinha apaixonada, só não era correspondida. Okay, até aí tudo ótimo, essas coisas acontecem mesmo, e nessa época eu não era lá o que se chamava de “a criança mais linda da escola”, apesar de ser bem popular.
Até os meus doze anos gostei desse mesmo “menino da sala” e, não se surpreendam, até os mesmos doze anos nunca, leiam pausadamente, N-U-N-C-A tive qualquer correspondência da parte do filha-da-puta.
Ah, coisas de criança, dirá você, quando crescer passa. Uma ova! Nunca tive um namorico desses dos 16 anos cheio de clichês, bilhetes, músicas, declaraçõezinhas, chocolates e um coelhinho na páscoa, coração de pelúcia no Natal, cinema com pipoca, beijos e coca-cola. Mas é adolescência, passa! AHAN!
Não sei se a compreensão é fácil, abdiquei as metáforas, sinestesias, e poesias nesse relato-bem-humarado-do-meu-mal-humor que é pra não restar dúvidas. Em caixa alta: EU NÃO TENHO SORTE, ponto final, próximo parágrafo.
Aos 16 não tive um namoro bobo, não terminei aos 17, não sofri um ano todo como qualquer outra (se bem que as pessoas de sorte, no mínimo, sofrem 3 meses, mas isso não vem ao caso), não achei que o mundo iria acabar, e que o meu amor era o maior que existia na galáxia inteira. Aos 18 não conheci a pessoa perfeita, não entendi sobre amor, não recebi presente de aniversário, nem beijo, nem abraço à meia noite. Não tive qualquer demonstração de presença sólida interna, externa e ao lado.
Talvez seja alguma conspiração dos astros, não, não, isso seria passageiro: o ano do inferno astral e, no meu caso, bota anos nisso. Acredito que tenha sido logo quando eu nasci. Naquele sábado de oito de janeiro de mil novecentos e oitenta e nove, ás três e trinta e cinco da madrugada plutão entrava no ano 6, com fluxos de energia em saturno, que estava em escorpião, e a lua estava minguante, o que a astrologia define como: vai pro diabo que te carregue, você acaba de nascer e desista, nunca vai ser feliz no amor. Olha lá, os astros já sorriam sarcasticamente pra mim, e o médico dizia: olha que criança linda! Cuidado, papai, você vai ter um trabalho danado com essa menininha dos olhos verdes.
Ah, se não fossem as bebedeiras e as mentirinhas, meu pai nunca teria tido trabalho algum, senhor doutor!
E não pensem vocês, caros leitores que possivelmente estão rindo e me achando uma gracinha de menina, que não há como piorar. Eu passei todos esses anos, em que todos estavam namorando e eu escrevendo, ouvindo que alguém um dia ainda teria muita sorte de me encontrar. E que alguém ainda me faria muito feliz. E que eu era a pessoa mais perfeita que já conheceram. E até mesmo a minha psicóloga, vejam vocês, já disse: “você tem uma sensibilidade incrível, nunca perca isso, e não se apresse, as coisas acontecem”. Quer saber? Vão tomar reticências.
Nunca fui mesmo de muita sorte, tenho me distraído com os sentimentos platônicos, tenho escrito sobre amores distantes, solidão compassada; tenho desejado sem poder, amado sem querer, beijado sem prazer; tenho mantido a ironia, o riso ; tenho pintado as unhas de vermelho, o cabelo eu não pinto, nos olhos a lágrima eu escondo, e no tempo eu já nem acredito mais.
Tenho sido patética, extremista, platônica, publicada, mal amada, auto destrutitva, sarcástica; tenho sido patética, patética e poeta. E, antes de nascer, perguntaram-me com voz de anjos em nuvens de algodão: quer ter amor ou poesia? Adivinhem só o que eu escolhi.

domingo, 9 de março de 2008

Personificação

por Keissy Carvelli

Essa brincadeira tola de abusar de uma racionalidade antes desconhecida custa uns bons pedaços daquilo que antes era inteiro, excesso, extremo. Proseia-se a poesia, solidifica os suspiros, dilui os sonhos de olhos abertos, cria-se uma espécie de teoria bem desenvolvida para qualquer coisa que seja sentida. Nessa brincadeira de não brincar, o soco silencia, o afago é escondido, a volta em círculos retoma em linha reta, a inércia é o comedido sem escrúpulos, e a roda gigante não é mais a atração principal do parque de diversões.
São horas para um único verso, muitos cigarros para vários vícios, e um só vestígio para todas as noites.
Ra-ci-o-na-li-da-de sem qualquer rima, sem apreço, sem um preço, prestação. Por vezes querendo fugir, por outras querendo encher a cara de um sadismo superior, uma ironia podre, sem classe. Por todas as vezes precisando de um pedaço inteiro, de um amor inteiro, completo, concreto em subjetividade; não uma mão, um beijo, um senão, uma contrapartida coesa, mas um deslize, uma insanidade, uma precisão.
São horas para uma única prosa. Essa racionalidade ou me alitera ou personifica.

sexta-feira, 7 de março de 2008

Subjetivamente

por Keissy Carvelli

Brinco com um porta copos e um cinzeiro bem dispostos e de fácil acesso a qualquer uma de minhas mãos. Tomo uma cerveja, e talvez eu acenda um cigarro; talvez eu cante algum refrão ou quem sabe eu saia por aquela porta, botando um pé atrás do outro num ato estritamente mecânico. Talvez eu não faça coisa alguma e prossiga nessas confusões literárias de ser, estar e querer.
Acho subjetivamente interessante essa imagem da menina sozinha num final de tarde tomando uma cerveja em seu quarto ouvindo qualquer "balada do amor inabalável" deixando a noite cair, e cair, e cair, e os olhos abertos decifrando todo pensamento oblíquo surgido no imaginário real e inconsolável sobre qualquer aspecto. Penso que essas cenas deveriam fazer parte de um filme, e antes que a música acabasse, surgiria um telefonema que a faria sorrir por horas, e então mudaria o repertório, dançaria no quarto, e sonharia em devaneios conscientes, e se embriagaria do prazer doce daquele "romance ideal", ainda que só nos sorrisos.
Mudo de parágrafo e logo chego a conclusão de que não há finalidade alguma nisso tudo, nessa prosa, nesse ácool, nessa precaução, nessa falta de tema. Substancialmente não há nada pra ser dito. Assinei, há pouco, uma revista mensal, e creio ser um passo importante tal qual comprar um carro, uma casa. É um tipo de "adultismo", se é que me entendem. A gente sai de casa, faz um cartão de crédito, entra na faculdade, procura estágio, compra cervejas, acende um cigarro no quarto e logo está ali, assinando uma revista jornalística para ler todo mês ao tomar café, ainda que eu não seja adepta do café preto em si.
Sinto não ter uma conclusão. Talvez eu abra outra cerveja e tenha orgasmos mentais com a tal da liberdade, com a tal da assinatura da revista. Sinto não ter uma conclusão, obrigada.

terça-feira, 4 de março de 2008

Desculpe, não encontro a expressão

por Keissy Carvelli

"Desculpe mais um clichê,
Mas paixão é sempre assim:
Um bom motivo pra escrever"

Não beirava o abismo; não soltava suspiros perdidos por entre os dias de saudade. Gozava da plena lucidez tátil, distante o bastante dos extremos de outrora; distante daqueles delírios em suor frio, e das encenações metafóricas diluídas em sentimentalismos eu era um saudosista, um nostálgico consciente.
Não espreitava qualquer ataque insano que pudesse me desfazer em lágrimas por meses a fio; não soluçava amores caídos de paixão pela boca trêmula de tristeza; não era a inconseqüência transitória entre o desespero e a necessidade.
Era o pensamento noturno daqueles beijos calmos e escondidos; era a saudade afugentada no peito, camuflada na racionalidade estúpida e real; era o corpo sentindo o perfume doce dos dias de sol e céu claros.
Era eu dizendo “não espero nada de ti” querendo um abraço longo; era eu desdenhando teus sinais em prol da minha estabilidade; era eu deixando a água correr, deixando a água doce tomar o lugar do sal e cair ao chão num silêncio mundial dos sentidos. Era eu dizendo em tom clichê: “não espero muito de você, tampouco nada; espero você”.
Era eu fabricando impressões, decidindo expressões das melhores lembranças e saudades de você.

segunda-feira, 3 de março de 2008

Poema em linhas tortas

por Keissy Carvelli

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus companheiros têm sido amados
E afagados pelas mãos suaves dos amores contidos.
E eu, sempre tão infantil,
Eu, por tantas vezes esmagado pela indiferença
Sutil e piedosa dos desamores;
Eu, tantas vezes perdido no descontrole
Firme dos meus devaneios intensos;
Eu, que tenho acabado sujo, desprotegido,
Vulnerável e mesquinho;
Que tenho derramado dos lábios um prazer doce,
Que tenho sido patético, submisso aos meus sentidos,
Que tenho sofrido madrugadas de solidão a dois;
Eu que tenho sido o piegas sonhador,
Que tenho tropeçado nos traços delicados de outra pele,
Eu verifico que não tenho par nisso tudo nesse mundo.

Mas meus companheiros não!
Ah, esses bem amados!
Comedidos e malditos!
Não perdem uma lágrima em desespero,
Não sussurram em gritos soltos
Promessas descabidas de amor eterno;
Não fraquejam em beijos de pernas trêmulas,
Não se entregam aos clichês dos versos em exagero.

Não, todos são comedidamente amados!
Jogadores sim, mas estupidamente apaixonados, nunca!

Argh!Estou farto desse sentimentalismo concreto,
Dessas paixões sem melodia, sem olhos e brilho.
Onde há intensidade nesse mundo?
Então sou o único inconseqüente e irracional dessa terra?

Ah, bem amados e coesos.
Podem terem sido covardes, mas sofridos de amor nunca.
E eu, que tenho sofrido sem ter sido amado,
Que tenho sido ridículo sem ter sido covarde,
Como posso eu escrever de amor?
Eu, parasita do que sinto,
Eu, que por um toque
Tenho me desfeito em sorrisos,
Eu, que tenho sido estúpido
Estúpido no sentido infantil da paixão.